A sociedade do Prozac em depressão

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Começo escrevendo baseado na tese de Karl Poper sobre quando ele declara a oposição que temos entre nossos conhecimentos e a nossa ignorância: conhecemos muito, mas nossa ignorância é sombria e ilimitada, contudo, absurdamente elas não são contraditórias!

O ser humano como sugere Jung quanto mais avança em sua ciência, mais frio se apresenta nas suas relações; seriamos uma sociedade então robotizada? Ou porque não uma sociedade lobotomizada¹? A tecnologia fornece bens de consumo, a ciência tenta sempre dar uma explicação e/ou criar novos conceitos na antítese dos padrões estabelecidos.

Então, a tecnologia não nos controla? A ciência não nos fecha aos complexos? Vejamos: a sociedade robotizada (conhecimento) ou lobotomizada (sombria) dentro da ironia proposta seria apenas: uma sociedade limitada pelas regras e institucionalizada pelas leis ou por apenas sua mais sombria ignorância?

A revolução industrial abriu as portas a um maravilhoso mundo novo, tão idealizado por autores como Júlio Werne, H. G. Wells, Philip K. Dick, mas que atualmente se configura mais próximo de um Brave New World (Admirável mundo novo) de Aldous Huxley, o qual retrata um povo condicionado desde o nascimento por um sistema de “valores” no qual se prega sê-lo “libertador” por suas regras, leis e estruturação – “estabilidade” –, e que corrompe claro, com os valores originais “alienistas” e disformes da sociedade antiga.

Naquilo que se usurpa de uma característica comum, logo em seguida uma nova característica surge para compensar a perdida, e assim mantém-se um equilíbrio que mais tem de ideologia do que de verdadeiro. As formas políticas e econômicas que constroem o mundo globalizado de hoje, descaracterizam a forma comunitária de agir, e insista numa forma individual de se viver em um sistema objetivo de ganhos e perdas.

A nossa forma do pensar é geradora de crenças e tais, normalmente não funcionam com lógica e razão, as crenças existem para preservar a sobrevivência como um sistema de recompensa. As crenças nascem das nossas relações com as questões mais intimas e com as relações de troca ininterruptas com o ambiente, ou seja, somos um produto do meio, somos um produto dos processos culturais que circundam o meio social.

A cultura da robótica e do capital que é a cultura do quantificar, divergente à relação nossa com as diversas formas de pensar, e principalmente o pensar crítico. É interessante quando Foucault discorre que a crítica seria um instrumento, um meio para uma transformação ou uma tentativa de se achar uma verdade, só que a princípio em seu olhar não se sabe qual é a verdade e esta claro não será uma verdade, e sim um domínio estabelecido pelos papeis que absorvemos no policiamento das ações alheias, mas sem que sejamos os legisladores de qualquer lei.

Então, saber pensar antes e desenvolver a crítica seria o caminhos de enfrentamento do pressuposto da alienação e subordinação à impressão primeira que nos empurra a aceitar como verdade única e imutável tudo que acreditamos a primeira vista.

Uma sociedade rendida é uma sociedade sem crítica, e a falta da crítica remete a um sistema escravagista moderno onde aceitamos as provocações institucionais e controle de massas, tudo em troca das maravilhas modernas, o que invariavelmente pode nos remeter a uma droga da obediência e fatalmente em conformistas. Quanto conformistas seguimos o empobrecimento da esperança, a negação do futuro, nada mais que aceitar tudo como uma “fatalidade” pela interpelação da nossa civilização moderna.

O jogo social constitui-se numa divisão aos que se caracterizam por sua dominância e os que se caracterizam por sua independência, mas que por fim, são moldados sobre a ótica de quem determina o valor a ser seguido, e ai provém o poder!

Nesta forma de poder sugiro um império: o consumismo! O consumo é a maior fonte de prazer em contrapartida daquilo que nos faz mais humanos – o afeto! Os bens de consumo substituem com maestria a nossa capacidade de nos relacionar e sentir prazer com o outro. É verdade que o ser humano busca intensamente a felicidade, mas a felicidade não pode ser consumida, a priori, deve ser construída.

Como tornar a felicidade então em um bem de consumo? Que se invente então a pílula da felicidade ora! Mas, como fazer? Um caminho fácil fora criar novos padrões estatísticos e de conduta onde àquele que não se encaixasse – desviante do processo “natural”, pudesse assim se tornar um consumidor pela total falta de opção.

No pensamento de Freud, em geral, nós (pessoas) experimentamos o presente de forma ingênua, sem seremos capazes de fazer uma estimativa sobre nós mesmo (principalmente no seio da sociedade), então vivemos hoje como uma sociedade do nada, da morte do sentido, o porquê não mais se questiona, é a verdadeira espera da morte pela anomia do que o Sociólogo Émile Durkheim entende quanto o enfraquecimento dos vínculos sociais e do social à perda da consciência coletiva gerando fatalmente o suicídio.

Por esse processo e por nossa condição “niilista” atual, vivenciamos uma verdadeira epidemia silenciosa, e muito evidente aqui discutido sobre as mazelas afetivas, por sim, uma questão de saúde mental. 

Vivemos o século da Depressão! A síntese é: a sociedade do Prozac² esta em Depressão! As pílulas da felicidade não estão funcionando como deveriam, ora, realmente não se pode comprar a felicidade! Seus efeitos “milagrosos” são passageiros. 

O filósofo Lou Marinoff afirma que é normal ter problemas, que nossas aflições emocionais não são necessariamente uma doença, mas como dizer as práticas de consumo que o problema não é necessariamente orgânico e, contudo, a medicação (que é importante, diga-se de passagem) não é a salvação?

Somos vitimas de nossas vulnerabilidades, mas como de nossa necessidade de monitorar e controlar tudo. Dados da Organização Mundial de Saúde (OMS) afirma que até 2020 a depressão será a segunda doença mais comum no mundo, e eu pergunto: teremos Prozac e outras medicações do “bem estar” como o Rivotril³ para todo mundo? 

E ainda: então onde é que devemos começar a mudar nossa história para que comecemos a melhorar a nossa qualidade de vida?

Por que a depressão terá que afetar tantas pessoas quanto às doenças cardíacas? Detalhe: prognóstico pior é para os países subdesenvolvidos onde há uma prevalência maior do transtorno. 

Poderíamos aqui interpretar segundo os dados da OMS que os pobres por ter taxas maiores de desemprego, nisto, menor poder aquisitivo e, contudo, menor poder de compra, não teriam como fazer desse produto o substituto do seu vazio afetivo?

A verdade é que mesmo com todo nosso desenvolvimento tecnológico e de conhecimento da vida e do universo, ainda não aprendemos que o sentido do conhecimento científico deve andar de mãos dadas ao sentido do conhecimento do próprio eu, nossa perspectiva de ignorantes ilimitados necessita retomar a estrada da sabedoria e da bem-aventurança antes que se perca a vontade dos sãos.

Robson Belo

Psicólogo, Psicopatologista e Psicoterapeuta

Clínica, Educação e Empregabilidade

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¹Intervenção cirúrgica no cérebro, onde são seccionadas as vias que ligam os lobos frontais ao tálamo e outras vias frontais associadas, com efeito terapeutico sedativo e causando baixa reatividade emocional no paciente submetido ao procedimento.

²Antidepressivo da família da fluoxetina, é um inibidor seletivo de recaptação de serotonina e indicado para o tratamento do Transtorno depressivo como o Transtorno Obssessivo-Compulsivo (TOC)

³Ansiolítico, é da família do clonazepam, medicamentos que causam inibição leve do sistema nervoso, com consequente ação anticonvulsivante, sedativa leve, relaxante muscular e tranqüilizante é indicado para tratamento de ansiedades como também transtornos de humor.

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Robson Belo

Psicólogo

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