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O Caso Charlie Gard é tudo que há de errado na Europa

Juiz britânico condena bebê à morte por problema genético

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Nas últimas etapas da elaboração do meu livro, pouca coisa me tira do foco. As farpas trocadas entre Eduardo Bolsonaro e o pessoal que veladamente apoia o fabiano João Dória quase me tiraram do foco (o Eduardo está coberto de razão em sua crítica ao Alexandre Borges).

Mas foi uma postagem de um contato (Patrícia Grah) no Facebook que fez o trabalho. O caso é mais ou menos o seguinte: Charlie Gard nasceu em 4 de agosto de 2016. Inicialmente, parecia uma criança saudável, mas começou a apresentar problemas de saúde e foi diagnosticado com uma doença chamada Síndrome de Depleção Mitocondrial, onde a má formação de suas mitocôndrias não permite que seu corpo receba energia suficiente para funcionar normalmente. Ele foi internado no hospital público Great Ormond Street Hospital, onde sua situação piorou e passou a depender de aparelhos para sobreviver. Eis que em 24 de fevereiro desse ano, o hospital (que deveria estar mais interessado em preservar vidas do que tirá-las) submeteu um formulário à justiça solicitando que os aparelhos de respiração artificial fossem retirados do bebê e que pudessem tratá-lo apenas com cuidados paliativos. Mas não apenas isso, eles pediram o consentimento legal para considerar nos “melhores interesses de Charlie, que ele não seja submetido à terapia de nucleotídeos”, desde que os tratamentos adotados pelo hospital fossem “compatíveis com manter a dignidade de Charlie”. A corte de justiça, por meio do juiz Nicholas Francis, acatou todos os pedidos, para desespero dos pais.

Sabendo do provável desfecho, antes mesmo do assunto ter chegado a esse ponto, os pais da criança (Constance Yates e Chris Gard) lançaram uma campanha no site Go Fund Me em 30 de janeiro desse ano (www.gofundme.com/please-help-to-save-charlies-life), buscando financiamento para uma terapia promissora nos Estados Unidos.

Eles conseguiram todos os recursos necessários para o tratamento (um total de £ 1,3 milhão, o equivalente a R$ 5,5 milhões), tendo apenas que levar o PRÓPRIO FILHO aos Estados Unidos para submetê-lo ao tratamento. Os pais recorreram, mas em 11 de abril o mesmo juiz manteve a decisão, decretando que era mais digno ao bebê “morrer em paz e com dignidade” (eu não estou inventando, a íntegra da decisão está aqui: http://www.bailii.org/ew/cases/EWHC/Fam/2017/972.html).

Desesperados, os pais apelaram (adivinhem para quem?) ao Tribunal Europeu de Direitos Humanos (TEDH), que confirmando as tendências socialistas que têm infestado a Europa nas últimas décadas, negaram o direito dos pais para levar o PRÓPRIO FILHO aos Estados Unidos onde ele teria uma chance de sobreviver. O TEDH considerou o apelo dos pais “inadmissível” e considerou sua decisão “final”, de modo que os pais não têm mais ninguém para apelar (na terra). Ou seja, tanto as cortes britânicas quanto as europeias querem que Charlie morra.

Nesta terça-feira, um evento promovido pela minha igreja (Comunidade das Nações) me fez ver o filme “O Círculo”, que fala sobre como os indivíduos podem se submeter a certas formas de controle em troca de segurança. No caso do filme, a protagonista (a Hermione do Harry Potter) entrega seus direitos de privacidade em troca de conforto social e, principalmente, um bom plano de saúde para seus pais. O pai de Mae (o nome da Hermione nesse filme) sofre de esclerose múltipla e ela precisa de dinheiro para pagar o tratamento. No começo, Mae parece ter dúvidas sobre as constantes invasões que a empresa faz à privacidade de todos. Mas depois que Tom Hanks (que no filme é o dono da empresa) oferece um ótimo plano de saúde para seus pais, ela parece se entregar de corpo e alma (pelo menos durante boa parte do filme) ao projeto do Círculo. Em uma das cenas, ela se entrega em um discurso sobre como o governo depende das empresas e que logo o Círculo poderá ter o controle sobre todo o processo de registro eleitoral nos Estados Unidos. Eu só estou falando desse filme porque considero ele fundamental para entender a CEGUEIRA IDEOLÓGICA que o mundo sofre nos nossos dias, permitindo que casos como o de Charlie Gard ocorram sem levantar muita poeira.

Em primeiro lugar, que qualquer pessoa que tenha visto o filme acabou levando para casa o discurso de que o governo não tem poder sobre as empresas e que, por isso, é o governo que é conduzido ao erro por empresários mal-intencionados. Na realidade o que ocorre é o contrário: a empresa mais poderosa do mundo NÃO PODE determinar que você seja OBRIGADO a comprar os seus produtos sem a ajuda do menor dos governos, mas o menor dos governos PODE FORÇAR os cidadãos a fazer o que não querem sem a ajuda da maior das empresas (podem compartilhar essa frase à vontade). Ou seja, a Hermione pode conspirar com o Tom Hanks contra as nossas liberdades à vontade, mas sem a ajuda do governo o Círculo não vai conseguir NADA.

Essa é uma primeira informação fundamental para entender o que há de errado com o filme e o que ele tem a ver com o caso Charlie Gard.

A segunda informação é que a relação entre a disposição de Mae para vender sua consciência em troca de um bom plano de saúde para o seu pai é EVIDENTE. Com certeza, dado o histórico de praticamente todos envolvidos no filme, a intenção não era alertar sobre os perigos de um governo que tem o monopólio da saúde da população. Muito provavelmente, a intenção era exatamente outra: forçar por um “sistema de saúde público e universal” para evitar que “empresas mal-intencionadas” controlem as pessoas por meio do fornecimento privado de planos de saúde.

Um dos projetos mais antigos dos socialistas é justamente a criação de um sistema de saúde universal e gratuito conduzido pelo estado, já que sem concorrentes para cuidar da saúde do povo fica mais fácil controlar as mentes mais fracas a fazer o que o governo quer em troca de um remédio ou uma cirurgia. Ou você acha que o SUS e o Obamacare são frutos de mentes altruístas e bondosas?

No final das contas, não precisamos de nenhuma ficção para ver o que a REALIDADE pode nos dizer. A realidade é a Grã-Bretanha, onde se pode matar bebês até o SEXTO MÊS de gestação. Um estado que permite tal tipo de absurdo vai se importar com a vida de Charlie Gard? Um juiz atuando dentro dessa estrutura criminosa vai se importar quando condena um bebê à morte? Uma Europa que deu às costas ao cristianismo vai ficar do lado da família Gard ou de um estado que permite o assassinato diário de bebês? Vocês já sabem a resposta. O fato é que a REALIDADE contradiz a FICÇÃO de “O Círculo” (e tantas outras que colocam as “empresas” como as vilãs e os estados como “vítimas”). No mundo real, é o estado que consente com o assassinato de crianças e PROÍBE os pais de levarem seus entes queridos para tratamentos alternativos. No planeta da supremacia estatal (note que eu não estou falando de Cuba ou da União Soviética: eu estou me referindo a “democracias” europeias), o governo proíbe empresas de fornecerem medicamentos a bebês e cidadãos de escolherem seus prestadores de saúde.

Minha esperança é que as pessoas vejam esse caso e passem a ter consciência do perigo que é o SUS, a Previdência Social, o sistema de controle sobre a educação, e tantas outras soluções mirabolantes que o estado inventa para controlar os corações e mentes do povo.

É perfeitamente natural que as pessoas busquem por segurança e bem-estar para seus entes queridos, mas quando elas se esquecem de suas responsabilidades e de seus valores, o que acontece é a manifestação de uma realidade muitas vezes pior do que a ficção. Na ficção de “O Círculo”, os protagonistas metidos a controladores sempre têm uma “desculpa” bem elaborada para querer tirar a privacidade alheia. Na realidade dos tribunais europeus, juízes determinam a morte de bebês alegando que é “do melhor interesse” dos bebês. Ou seja, até o esmero em encontrar uma boa desculpa para cometer absurdos é maior na ficção.

Enfim, estamos em um mundo de loucos. E os loucos já conseguiram chegar ao poder e estabelecer seus sistemas de governo. Temos que ter consciência disso para lutar contra tudo de ruim que isso acaba gerando. Ou seja, não basta apenas ser “contra” as decisões das cortes europeias: temos que dizer em alto e bom tom que elas estão cometendo absurdos e que DEVEM pagar por isso. Não basta apenas dizer que somos contra o assassinato de bebês: temos que ser radicais em nossas propostas de ACABAR com os sistemas que legitimam tais crimes em todo o lugar que eles existirem.

E, voltando ao começo do texto, é por isso que não basta simplesmente achar que um posicionamento de direita é suficiente para nos tornarmos “sãos” em um mundo de loucos: temos que ter certa intolerância às modernices esquerdosas que seduzem as mentes mais fracas. O que quero dizer é: não se divulga um livro que se propõe a falar de direita usando João Dória como garoto-propaganda (como Alexandre Borges parece ter feito). Temos que ser mais espertos do que isso e ir ALÉM da reação contra os absurdos oferecidos pela esquerda. Enquanto isso não acontecer, a vida de crianças como Charlie Gard continuarão em perigo, empresas continuarão a ser demonizadas em filmes e palhaços fabianos continuarão transitando em meios de direita como se fossem dignos de qualquer apoio.

Henrique Guilherme

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Henrique Guilherme

Economista, mestre em administração pública e especialista em matemática, estatística e administração de empresas. Apresentou os programas "O Patriota: A Voz da Resistência" no canal de rádio www.blogtalkradio.com/opatriota, é conservador, de direita e nerd.

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