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“Isolamento inteligente” versus “isolamento estúpido”: Por que ainda estamos sendo orientados pela estupidez?

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“E conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. João 8:32

“Não tenho dúvidas de que, quando olharmos para trás, os danos causados pelos isolamentos excederão qualquer economia de vidas por um grande fator". Michael Levitt (Prêmio Nobel em química).

Em uma entrevista a Freddie Sayers (disponível no Youtube com o título “Nobel prize winning scientist Prof. Michael Levitt: lockdown is a ‘huge mistake’ ”) o Professor e pesquisador da Faculdade de Medicina da Universidade Stanford, Michael Levitt, afirma categoricamente: “o lockdown – isolamento – é um grande erro”.

Prêmio Nobel de química em 2013, o Professor Levitt defende a ideia de um “isolamento inteligente” (“smart lockdown”). Tal isolamento “inteligente” envolveria aquilo que em outros textos chamei de “intervenção vertical”, isto é, uma intervenção focada no isolamento de idosos e daqueles que fazem parte do grupo de risco. Ou seja, nesse caso agir inteligentemente implicaria em protegermos especialmente os vulneráveis. Além disso, obviamente seria prudente evitarmos grandes aglomerações, adotarmos hábitos de higiene, etc.

E quanto ao “isolamento estúpido”? Onde jaz sua raiz?

Tal isolamento “estúpido” (uso aqui esse termo para opô-lo à ideia de um “isolamento inteligente”) teria como ponto de partida um artigo assinado por Neil Ferguson (Imperial College), no qual ele defende o isolamento social nos moldes que estão vigendo em diversos países (como no Brasil, sobretudo em alguns estados), o que envolve o fechamento de instituições de ensino e do comércio, etc.

Em suma, ele sustenta a necessidade do afastamento social imposto com medidas despóticas. Um detalhe interessante e digno de nota é que nem ele seguiu suas orientações.

Recentemente ele deixou sua posição como consultor do governo britânico por romper o isolamento - defendido por ele - para encontrar sua amada.

Sua renúncia se deu após o jornal Daily Telegraph revelar que ele não estava seguindo suas próprias orientações. Se não bastasse isso, Ferguson tem um histórico de “previsões” erradas.

Em 2001 ele foi o (ir)responsável pela pesquisa que levou ao abate centenas de milhares de animais em fazendas em virtude da febre aftosa. Posteriormente sua pesquisa foi refutada por diversos pesquisadores.

No ano seguinte ele “previu” que a “encefalopatia espongiforme bovina”, vulgarmente conhecida como doença da vaca louca, causaria a morte de centenas de milhares de pessoas. Menos de 200 pessoas morreram.

Em 2005 suas “previsões” foram além: segundo suas pesquisas, morreriam 200 milhões de pessoas da gripe aviária. Ele inclusive comparou a gripe aviária à gripe espanhola de 1918. Mas ao invés dos milhões de mortos, houve algumas centenas.

Em 2009 foi a vez de ele tecer “previsões” sobre a gripe suína. Segundo ele, a taxa de mortalidade seria de aproximadamente 0,4 por cento. Isso levaria a cerca de 65 mil mortes no Reino Unido. Ao final morreram 457 pessoas (0.026 por cento).

Em suma, Neil Ferguson não é infalível. Tampouco o Imperial College.

Ferguson pode ser um bom pesquisador em diversos aspectos. O Imperial College pode ser uma instituição relevante. Mas eles não possuem o monopólio da verdade. São, pois, defectíveis.

De qualquer maneira, as “previsões” de Neil Ferguson estão influenciando dogmaticamente a Organização Mundial da Saúde (OMS) e diversos governos, em uma espécie de efeito cascata, chegando sua interposição mesmo em cidades provincianas como aquela em que resido atualmente. E isso mediante a orientação de “especialistas” de instituições também provincianas, nas quais vige aquele ditado segundo o qual “em terra de cego quem tem um olho é rei” (ditado ao qual se poderia acrescentar: “e quem tem dois olhos é muito mal visto”).

Noutros termos, isso explica estarmos sob a tirania de um “isolamento estúpido”, bem como de praticamente não termos espaço para o dissenso, para a exposição de posições que difiram do mainstream que decidiu dogmaticamente pelo “isolamento estúpido”.

Com efeito, o Professor Levitt (que foi laureado com o prêmio Nobel pelo “desenvolvimento de modelos em várias escalas para sistemas químicos complexos”, ou seja, pelo seu trabalho com números e estatística), sustenta que, independentemente das intervenções estatais (impondo um isolamento radical, por exemplo), existe um padrão matemático semelhante e, mesmo, mensurável, no surto de covid-19 em diversos países, como China, Itália, França, USA, Inglaterra, Irã, Coreia do Sul, etc; ou seja, independentemente das medidas adotadas, a desaceleração da pandemia ocorre dentro de um padrão que mantém um nivelamento (“achatamento”) em uma fração muito aproximada da população total.

Mas, qual seria a política sensata, “inteligente”, segundo o Professor Levitt?

Ora, seria “a política da imunidade de rebanho”. Em seus termos, “eu vejo que os países que se saíram excepcionalmente bem como Alemanha e Suécia (...) não praticaram muitas restrições e deixaram um número suficiente de pessoas contraírem a doenças para obter alguma imunidade de rebanho”. “Países como Áustria, Austrália e Israel, que tiveram isolamentos muito rigorosos (...) danificaram suas economias, causaram danos sociais maciços, prejudicaram o ano educacional de seus filhos, mas não obtiveram imunidade de rebanho”.

Outro estudo relevante que corrobora a ineficiência do isolamento nos moldes em que ele nos foi imposto tiranicamente está descrito no artigo “Full lockdown policies in Western Europe countries have no evident impacts on the COVID-19 epidemic”, de Thomas Meunier. Como lemos em seu ‘abstract’, “esse estudo fenomenológico avalia os impactos das estratégias de isolamento total aplicadas na Itália, na França, na Espanha e no Reino Unido para o abrandamento do surto de covid-19 em 2020”.

Com efeito, ainda no texto do ‘abstract’ encontramos indícios da conclusão da pesquisa: “comparando a trajetória da epidemia antes e depois do isolamento total, não encontramos evidência alguma de qualquer descontinuidade nos padrões de crescimento da taxa, de duplicação do tempo e do número de reprodução”. Mais ainda: “demonstramos que essas estratégias não salvaram quaisquer vidas na Europa ocidental. Também mostramos que países vizinhos, que aplicaram medidas de distanciamento social menos restritivas (...), experimentaram uma evolução muito similar da epidemia”.

Dito de outra forma, tanto países que adotaram medidas restritivas draconianas quanto países que adotaram medidas brandas de distanciamento, tiveram padrões similares de evolução do covid-19.

Em sua conclusão lemos, então, que “esse trabalho sugere que medidas de distanciamento social como aquelas adotadas na Holanda e na Alemanha, ou na Itália, na França, na Espanha e no Reino Unido antes das estratégias do isolamento total, têm aproximadamente os mesmos efeitos que as políticas de contenção domiciliar”.

A real diferença é que aqueles países que adotaram medidas severíssimas sofrerão consequências devastadoras, seja para sua economia seja para seu sistema de saúde (dado estarmos agora fomentando uma “demanda reprimida”). Sem falar que o isolamento não evita necessariamente a propagação da infecção pelo covid-19.

Nessa semana o governador de Nova York, Andrew Cuomo, revelou, ainda “chocado” com os fatos (ele era um defensor dogmático do isolamento total), que 66% das pessoas infectadas mais recentemente estavam em isolamento domiciliar quando foram infectadas.

Esses dados dizem respeito a 1000 pessoas em 100 hospitais no estado de Nova York.

Portanto, a realidade conflita com aquele discurso pró-isolamento, um discurso segundo o qual o isolamento domiciliar asseguraria que a infecção não se espraiaria.

Além de 66% desses pacientes serem oriundos de suas casas (onde estavam isolados), 18% são de casas geriátricas, 1% advém de sistemas prisionais, e assim por diante. Ao final, dessas 1000 pessoas restam apenas 8% (talvez menos) que não estariam “isoladas” seja em casa seja em algum outro ambiente.

Como vemos, os fatos vão, gradualmente, fazendo colapsar a narrativa vigente segundo a qual o isolamento social é necessário para conter o avanço do covid-19.

“E conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”.

A verdade está sendo desvelada. Que sejamos libertos o quanto antes, uma vez que a tragédia já se faz sentir.

Para que tenhamos em mente alguns dados, segundo a 4E consultoria (“consultoria que atua em inteligência econômica e inteligência competitiva”), por exemplo, podemos chegar a um cenário com 20 milhões de desempregados “em algum momento entre julho e setembro”.

Cabe notar que nesse momento já contabilizamos 10 milhões de desempregados e centenas de milhares de empresas fechadas. Mas há cenários ainda mais assustadores. Todos eles vinculados às políticas de isolamento adotadas por prefeitos e governadores, os quais, orientados pela estultice, nos têm imposto um “isolamento estúpido”.

Somos, nesse momento, reféns da estupidez, a qual nos tem tolhido abjetamente a liberdade em todas as suas formas. E, como sabemos pela história, sempre que a liberdade é tolhida o resultado é o mesmo: miséria, desespero e morte.

Carlos Adriano Ferraz. Graduado em Filosofia pela Universidade Federal de Pelotas (UFPEL), Mestre em Filosofia pela Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), doutor em Filosofia pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS), com estágio doutoral na State University of New York (SUNY). Foi Professor Visitante na Universidade Harvard (2010). Atualmente é professor da Universidade Federal de Pelotas (UFPEL) na graduação e no Programa de Pós-Graduação em Filosofia, no qual orienta dissertações e teses com foco em ética, filosofia política e filosofia do direito. Também é membro do movimento Docentes pela Liberdade (DPL), sendo atualmente Diretor do DPL/RS.

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