Caso chegue uma inesperada convocação para guerra, você está pronto?

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Estava em casa tranquila, assistindo um filminho água com açúcar, tomando Coca-Cola geladíssima e comendo pipoca de microondas quando soou a campainha.

Com muita preguiça e certa raiva por precisar pausar bem no momento em que o mocinho beijaria a mocinha, fui abrir a porta.

Era o cara dos Correios.

Assinei um documento e ele se despediu.

No envelope constava o brasão da República Federativa do Brasil.

Estranho, mas a correspondência era mesmo pra mim já que no destinatário estava meu nome.

Apreensiva, pra ser bem sincera, sentindo medo, rasguei o papel amarelo.

Estupefata, estava sendo convocada para a guerra.

Não tinha escolha, era dizer SIM ou SIM.

Meu Deus, pensei, guerra? O Brasil está em guerra?

Em estado de semiconsciência, tentei pensar apesar de meus sentimentos limitadores.

Guerra, guerra…

Lembrei da Guerra Fria em que Rússia e Estados Unidos friamente guerreavam contra inimigos ideológicos.

Mais ativa em meu raciocínio, associei tal fato histórico com o momento atual de meu país.

Verdade, não tinha me dado conta, mas estamos em guerra.

Não há saída, preciso ir pro front de batalha.

Troquei meu quase-pijama e me apresentei na hora e data estipulada.

Um misto de honra e temor invadiram meu primeiro dia Militar.

Usando minha farda de trabalhadora, soube que nosso inimigo era incomum.

Invisível, escorregadio, fluido, gasoso.

Não poderíamos vê-lo com os olhos nem atingi-lo com armas nem mísseis.

Era quase onipresente.

Estaria na planície, no vale e no Planalto.

Na favela, no beco, no Palácio.

Na TV, na notícia, na novela.

Na piada, no show, na brincadeira.

Na escola, na infância e na adolescência.

Era quase onisciente.

Estaria camuflado entre as letras dos jornais, nas bocas de pessoas insuspeitas.

Esconderia sob letras de música e nas cenas de cinema.

Na pintura, no grafite, no museu.

A mentira seria dita até se tornar verdade.

Ia vomitar pudor e moral sem corar a face.

Era quase onipotente.

Faria o horror se passar por belo, o inescrupuloso por libertário, a morte e a doença, o Graal almejado.

A pobreza, meta.

A divisão, certa.

A doença, aliada.

A morte, consagrada.

Inimigo cruel com boca de mel que faria difamação e calúnia serem aplaudidas de pé.

O mais temido oponente dos brasileiros.

Diante dessas características, novas armas seriam necessárias.

Usaríamos nossa inteligência, nosso raciocínio, nosso pensamento.

Nenhum tiro.

Nenhuma bala atravessaria nenhum corpo físico.

A gramática seria disparada com seus dados.

A ortografia lançaria seus certeiros fatos.

Os vídeos esquecidos seriam recuperados para trazer à tona, atos.

Para a Guerra contra as Mentiras das Narrativas, fui convocada.

Nunca pensei que minhas aulas de Português, meus livros e minhas leituras me serviriam como minhas principais ferramentas de combate.

Aqui estou eu, meu país, pronta para lhe servir e retribuir o que recebi da escola pública e dos vinte e cinco anos de serviço público como professora de crianças, adolescentes, adultos com e sem deficiência.

Aqui estou, sem camuflagem, fuzil, tanque ou trincheira.

Positivo e Operante!

Ass: Uma guerreira brasileira!

Foto de Nara Resende

Nara Resende

Psicóloga clínica de adolescentes e adultos, escritora de Divã com poesia, Freud Inverso e organizadora do livro O jovem psicólogo e a clínica.

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