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Por que o exército venezuelano é controlado pelas Forças Armadas Revolucionárias de Cuba?

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Há décadas a Venezuela deixou de ser um país independente.

Hoje, a república socialista bolivariana é basicamente uma sucursal da ditadura cubana. Não pensa, não age, não negocia, nem faz acordos por conta própria. Pouquíssimas pessoas, no entanto, conhecem com profundidade a extensão da conexão existente entre as forças armadas da Venezuela e os serviços de contrainteligência militar cubanos.

A verdade, no entanto, é que o segundo está profundamente infiltrado no primeiro, com o objetivo de inibir insurgências, revoltas e dissidências, reprimir e desencorajar atos de insubordinação, e garantir que o exército permaneça leal ao ditador Nicolás Maduro, o supremo poder da república bolivariana.

Mas como foi que a Venezuela — de país independente e modesta potência latino-americana — tornou-se uma subalterna colônia de Cuba? Para entender exatamente como a Venezuela chegou no ponto em que se encontra, é necessário retroceder um pouco no tempo.

Depois que União Soviética se desmantelou, em 1991, Cuba, até então sustentada pela URSS, percebeu que precisava parasitar outra nação para sobreviver. Quando Fidel Castro soube que em 1999 o caudilho socialista Hugo Chávez chegara ao poder na Venezuela — um indivíduo que conheceu pessoalmente, depois de Chávez ter adquirido notoriedade por tentar tomar o poder em um fracassado golpe de estado, em 1992 —, o ditador cubano percebeu que tinha nas mãos uma excelente oportunidade para se dar bem.

Depois que conheceu Chávez um pouco melhor — e constatou que ele era o idiota útil perfeito —, o dissimulado ditador cubano soube que poderia explorar a Venezuela, uma das nações mais ricas do mundo, com a maior reserva de petróleo em existência, em seu próprio benefício, com o objetivo de enriquecer avidamente.

Depois de desenvolverem uma relação mais próxima, Fidel e Chávez consolidaram uma aliança política. Assim que adquiriu o gosto pela presidência, Chávez solicitou conselhos de Fidel sobre estratégias para permanecer indefinidamente no poder.

O ditador cubano falou para Chávez que ele teria que controlar os militares. Controlando os militares, ele poderia se manter no poder, por muito tempo. Fidel, então — em troca de um suprimento vitalício de milhares de barris de petróleo — mandou consultores militares até a Venezuela, para ensinar a Chávez tudo o que ele deveria fazer para manter rígido controle das forças armadas; e assim, se perpetuar no poder como ditador da Venezuela.

Aos consultores enviados à Venezuela por Fidel, foram concedidos poderes plenipotenciários, para gerenciar e reestruturar o exército venezuelano, como bem entendessem. Para controlá-lo, inibir revoltas, dissidências e líderes carismáticos com pensamento independente, os agentes cubanos desenvolveram departamentos com mecanismos de vigilância, para monitorar todos os integrantes das forças armadas.

Eventualmente, foi criada a Diretoria Geral de Contrainteligência Militar, que serve para espionar todos os indivíduos que estão direta ou indiretamente ligados às forças armadas da Venezuela. A instituição existe também para difundir um clima de desconfiança, ansiedade e tensão entre oficiais e soldados, de maneira que o medo latente que paira na caserna — já que todos tem plena consciência de que são constantemente vigiados —, faz com que todos vivam em um estado de aflição e insegurança permanentes, deliberadamente arregimentado para inibir rebeliões e golpes de estado, desencorajando os militares a se insurgir contra a ditadura, já que aqueles que o fizerem serão facilmente descobertos, e então sofrerão as consequências da traição.

Desta maneira, a Diretoria Geral se transformou no eixo central de um poderoso, potente, implacável e intocável sistema de departamentos interligados de espionagem, responsável pela supressão de atividades políticas consideradas subversivas pelas ditaduras, em uma cadeia de conexões que passou a mesclar agentes cubanos e venezuelanos de tal forma que estes tornaram-se indissociáveis e indistinguíveis, embora os governos de ambos os países neguem categoricamente uma parceria nesse sentido.

Com o passar do tempo, no entanto, os agentes cubanos foram ganhando cada vez mais controle e proeminência sobre as agências e o sistema militar venezuelano, em um intercâmbio dinâmico de capacitação estratégica e tecnológica contínua, que conduzia soldados venezuelanos para treinamentos regulares em Havana, e os ensinava a espionar diligentemente os seus próprios correligionários.

A eficiência desse trabalho agressivo pode ser comprovada pela crueldade e pela brutalidade da anatomia de um sistema que — com o passar do tempo — se tornou intrinsecamente vertical, inflexível e autoritário, projetado para agir sem quaisquer escrúpulos ou respeito pela integridade da vida e da dignidade humana.

Hoje, existem centenas de oficiais e militares venezuelanos presos, acusados de sedição, a maioria sem base factual e sem evidências. Muitos deles foram vítimas de tortura excruciante em cativeiro.

Ainda que este sistema tenha sido meticulosamente projetado na época de Hugo Chávez, hoje ele está plenamente consolidado, e é basicamente graças a ele que Nicolás Maduro consegue se manter no poder. Depois que os venezuelanos — através de um grande levante popular que deflagrou uma intervenção militar — foram capazes de tirar Chávez do poder em 2002, a população pensou que assumiria novamente o controle do seu país.

Infelizmente, estavam errados. Chávez não ficou nem quarenta e oito horas preso. Com o insidioso auxílio político de um dos seus grandes amigos, o socialdemocrata brasileiro FHC, o ditador venezuelano foi restituído à posição de poder, e mandou matar todos os militares envolvidos em sua deposição. Logo em seguida, Chávez começou um derradeiro processo de higienização dentro do exército e das forças de segurança, demitindo e dispensando inúmeros indivíduos, deixando apenas aqueles que eram incondicionalmente leais a ele.

O ditador colocou nos principais postos de comando homens completamente fiéis ao regime, e desta maneira, deu início a um rígido processo de controle do aparato militar, mantendo estrita supervisão sobre o mesmo.

Hugo Carvajal era um desses homens de confiança de Chávez. Parceiro do malfadado golpe de estado de 1992, ele eventualmente subiu ao posto de diretor-geral da Inteligência. Com financiamento do Banco Central, ele deu início a um complexo processo de modernização e centralização dos serviços de inteligência, que passaria a ser inteiramente monopolizado pelas forças de segurança do governo.

Atualmente, Carvajal está preso na Espanha, mas ele pode ser extraditado para os Estados Unidos, onde é acusado pelas autoridades de tráfico de entorpecentes.

Chávez passou também a investir maciçamente em doutrinação, sobretudo para os militares, que — sofrendo com a constante e perniciosa lavagem cerebral da propaganda estatal — passaram a condenar com veemência o "inimigo imperialista", culpando os americanos por tudo de ruim que acontecia no país, ao passo que glorificavam e veneravam Chávez com ostensiva afetação e sentimentalismo.

Quando Chávez perdeu o referendo oportunista que o permitiria concorrer a sucessivas eleições indefinidamente, um recurso legalista proposto por ele próprio para se perpetuar no poder, ele culpou convenientemente o inimigo externo, o imperialismo ianque, e prometeu uma revanche.

Em 2008, Cuba e Venezuela assinaram dois acordos de cooperação militar mútua, que permitiriam — informalmente — ao serviço de inteligência cubano expandir o seu controle de forma irrestrita sobre as forças armadas venezuelanas, o que eventualmente transformaria os soldados venezuelanos em escravos de um sistema tirânico e totalitário.

Os acordos propunham enorme intercâmbio entre os exércitos dos dois países, treinamento de milícias venezuelanas em Havana, prospecção de seleção e recrutamento de agentes, e cursos de espionagem, investigação e infiltração ministrados de forma contínua .

Os acordos, no entanto, concediam exacerbado poder aos agentes cubanos sobre o exército venezuelano, que se tornaria basicamente um esquadrão militar subalterno da ditadura de Fidel. Muitos dos venezuelanos enviados a Havana passaram a servir como agentes duplos, treinados para espionar militares e reportar atividades suspeitas aos seus superiores.

As diversas repartições que se multiplicaram sob os serviços de inteligência ficaram todas centralizadas na Diretoria Geral de Contrainteligência Militar, e todos os recrutas passaram a ser questionados sobre suas convicções políticas periodicamente.

Quando Chávez finalmente conseguiu expandir os seus poderes plenipotenciários — acabando com limites de mandato —, a Diretoria também assumiu funções de contrainteligência, e centenas de novos empregados foram contratados para aumentar a vigilância sobre o aparato militar, inibir quaisquer dissidências internas, e expandir o poder do estado sobre as forças armadas.

Depois que os venezuelanos enviados a Cuba retornavam, eram instruídos a se infiltrar na caserna, e reportar toda e qualquer atividade suspeita que vissem. Eram instruídos também a desempenhar uma conduta implacável, destituída de compaixão, remorso e empatia pelos seus colegas.

Os agentes infiltrados tinham várias maneiras de inspecionar os militares. Uma delas era plantando a semente da desconfiança e da discórdia, e jogando uns soldados contra os outros, criando um clima radiante de tensão e medo nos quartéis. Torturas praticadas pelos agentes contra indivíduos suspeitos de serem dissidentes tornaram-se cada vez mais corriqueiras.

Com a fome e a escassez que atualmente acometem a Venezuela, até mesmo os militares passam fome, especialmente os de baixa patente. Como consequência disso, a deserção se tornou um problema recorrente.

Com a intensificação da crise, as ocorrências de deserção tornaram-se muito frequentes. Para tentar coibir a fuga de soldados, os departamentos de vigilância e inteligência do regime tornaram-se mais agressivos, truculentos e invasivos. Os agentes da Diretoria Geral de Contrainteligência Militar passaram a monitorar de forma deliberadamente opressiva soldados e oficiais, grampendo telefones e ameaçando as famílias dos que pensam em fugir.

Literalmente, os expedientes mais desumanos e cruéis passaram a ser empregados para desencorajar desertores em potencial.

Alta tecnologia de espionagem também passou a ser empregada para o monitoramento de indivíduos considerados possíveis traidores. Indivíduos que decidiram se desligar voluntariamente das forças armadas por não se sentirem mais entusiasmados com relação à revolução bolivariana passaram a ser vistos como "contrarrevolucionários".

Muitos eram convocados a dar "esclarecimentos" na sede da Diretoria Geral. Torturas excruciantes tornaram-se cada vez mais recorrentes. Rafael Acosta, capitão da Marinha — de cinquenta anos de idade —, foi uma das vítimas da repressão brutal do sistema, cuja morte gerou comoção na imprensa internacional. O veterano morreu sob custódia, no dia 29 de junho de 2019, depois de ter sido brutalmente torturado.

O caso gerou enorme repercussão, obrigando o governo a reconhecer os excessos cometidos pela Diretoria Geral de Contrainteligência Militar, e países em todo o Mercosul repudiaram a atrocidade cometida.

A situação atual da Venezuela — fato que é confirmado pelas últimas duas décadas de sua história — mostra claramente como esta outrora belíssima nação foi infectada por uma perniciosa, belicosa e destrutiva ideologia, e suas forças de segurança foram absolutamente sequestradas por Cuba, ficando impossibilitadas de usufruir até mesmo de um grau mínimo de autonomia e independência.

Sua estrutura está tão viciada, tão arraigada ao terror da paranoia do totalitarismo de estado, que mesmo que os cubanos fossem embora imediatamente, os departamentos de inteligência e as instituições militares não se tornariam mais flexíveis de uma hora para outra.

Em nome da ambição, da riqueza e da manutenção do poder a qualquer preço, a tirania castrista conseguiu efetivamente subjugar e transformar a Venezuela em um enorme presídio a céu aberto, convertendo-a em uma deplorável duplicata de Cuba, porém em uma escala ainda maior.

Reduzidas a condição de paupérrimas favelas autoritárias em pleno Caribe, Cuba e Venezuela são o retrato do socialismo pleno. Lugares onde há fartura, luxo e riquezas para a classe política, e miséria, sofrimento e degradação para o restante da população. Hoje, 96% da população venezuelana vive na mais absoluta e deplorável pobreza.

O tão sonhado igualitarismo da esquerda foi praticamente atingido; como sempre, no entanto, a igualdade é sempre atingida na miséria, jamais na riqueza

Pobre da Venezuela, que — com um passado tão glorioso e promissor, tendo sido na década de 1970 o quarto país mais rico do mundo, com as maiores reservas de petróleo do planeta —, tenha reduzido seu presente e seu futuro a um cemitério político de lágrimas e cinzas, com abundante degradação e sofrimento.

Triste condição para uma nação que, até pouco tempo atrás, era considerada uma das mais prósperas e auspiciosas do mundo. O socialismo é um crime contra a humanidade, e todas as evidências históricas atestam isso de forma irrefutável e contundente.

Wagner Hertzog

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