Os donos da Constituição ou a astúcia dos privilegiados

28/10/2020 às 16:44 Ler na área do assinante

Finalmente alguém despertou para o texto constitucional.

O líder do Governo, Ricardo Barros, em um evento virtual organizado pela Academia Brasileira de Direito Constitucional, disse que o Brasil está em situação ingovernável e deveria seguir o exemplo do plebiscito do Chile e convocar uma assembleia nacional constituinte para escrever uma nova Constituição.

"Eu, pessoalmente, defendo uma nova assembleia nacional constituinte. Acho que devemos fazer um plebiscito, como fez o Chile, para que possamos refazer a carta magna e escrever muitas vezes nela a palavra 'deveres', porque a nossa carta só tem direitos e é preciso que o cidadão tenha deveres com a nação", afirmou o líder do governo.

Imediatamente a Globo e seus satélites acionaram “os arsenais de guerra” e convocaram juristas, políticos, artistas, comentaristas, analistas para durante todo dia de ontem criticarem a proposta, que chamaram de “ataque a constituição”, sob a manchete de:

“Juristas e políticos reagem a ataque do líder do governo à Constituição”.

No texto, os “iluminados” chamados pelo g1.globo, DEFENDEM a carta constitucional, com obviedades assim:

- Luiz Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal:

"Nós temos no Brasil uma democracia bastante resiliente, que vive sob a Constituição de 1988 há 32 anos recém-completados", afirmou o ministro. "Tivemos momentos difíceis na vida brasileira”.

- O ex-presidente do Supremo Tribunal Federal ministro Ayres Brito:

"Isso, exatamente, a Constituição, se bem entendida, bem interpretada e bem aplicada conduzirá o Brasil ao melhor dos destinos, um destino politicamente democrático, volto a dizer, filosoficamente humanista e culturalmente civilizado”.

- O ministro Carlos Velloso, que também presidiu o Supremo, disse que é um "golpe" defender agora uma assembleia constituinte".

"Em síntese, seria um golpe de estado porque não se muda a Constituição ao sabor da vontade das pessoas. Não. A Constituição foi feita para durar", declarou.

Notem que todos, malandramente, se recusaram discutir o que foi proposto: “OS PRIVILÉGIOS” QUE EXISTEM EM NOSSA CONSTITUIÇÃO e que são usufruídos pelos que opinaram!

E o povo? O Povo que mora no Brasil, trabalha, paga impostos que sustentam todos esses “nobres cheios de privilégios”, não sabe se existe Constituição, pois somente os que mandam foram chamados a opinar se a Constituição que permite todas essas “regalias” aos donos do poder e da nação é apropriada, é cidadã, se é isso mesmo que querem. O povo? O povo não tem voz. Parece que o povo é só um detalhe.

Como o povo não foi chamado para dizer o que pensa, eu cito algumas aberrações e chamo o gênio da raça, Roberto Campos, para me ajudar nessa tarefa:

- Quem gostaria de viver sob uma constituição que obriga cada cidadão a votar? Respondo: Ninguém!

- “Os estudiosos de Direito Constitucional aqui e alhures não buscarão no novo texto lições sobre arquitetura institucional, sistema de governo ou balanço de poderes. Em compensação, encontrarão abundante material anedótico. Que constituição no mundo tabela juros, oficializa o calote, garante a imortalidade dos idosos, nacionaliza a doença e dá ao jovem de dezesseis anos, ao mesmo tempo, o direito de votar e de ficar impune nos crimes eleitorais? Nosso título de originalidade será criarmos uma nova teoria constitucional: a do ‘progressismo arcaico”. (Roberto Campos, O Século Esquisito, p. 198).

- Quem gostaria de viver sob as leis de uma constituição onde os políticos eleitos recebem verbas bilionárias do estado para se reelegerem novamente? Respondo: Ninguém!

“O povo percebe que a ‘constitucionalite’ não lhe melhorou as condições de vida. Aliás, se isso acontecesse, os ingleses estariam perdidos, pois não têm constituição escrita. E os japoneses ainda pior, pois sua constituição foi escrita pelos americanos vitoriosos na guerra. Ante a prosperidade japonesa, chegar-se-ia à bizarra conclusão que a melhor constituição é a escrita pelos inimigos”. (Roberto Campos, O Século Esquisito p. 209.).

Quem gostaria de viver sob as asas de uma constituição onde os políticos são pessoas especiais, tem foro privilegiado, e um juiz ao cometer crimes é aposentado ganhado um salário astronômico? E graciosamente isso se chama punição. Respondo: Ninguém!

“A desastrosa Constituição de 1988 - inspirada pela portuguesa, da qual os lusitanos se arrependeram quando se deram conta de que haviam sido cravados pela “revolução dos cravos” – representou, para usar a feliz expressão do professor Paulo Mercadante, um “avanço do retrocesso”. (Roberto Campos, Antologia do Bom Senso, p. 301).

Quem gostaria de viver sob uma constituição onde os dirigentes da República são como reis, os deputados, senadores e juízes são nobres da corte e gozam de “prerrogativas” inalcançáveis e inimagináveis por qualquer brasileiro e onde os advogados que se notabilizaram por suas relações com partidos políticos, se tornaram Ministros do Supremo e posam de seres divinos? Respondo: Ninguém!

“Durante a gravidez e parto da nova Constituição, os constituintes brincaram de Deus. Concederam imortalidade aos idosos. Aboliram a pobreza por decreto. Legislaram custos, acreditando que legislavam benefícios. Tabelaram juros, esquecendo-se de que o governo é o principal demandante de crédito. Dificultaram despedidas, sem se dar conta de que assim desencorajariam novas contratações. O resultado dessas frivolidades será mais inflação e menos emprego. Nem chegaram a aprender que, num país sem inimigos externos que lhe ameacem a sobrevivência, o verdadeiro nacionalismo é criar empregos”. (Roberto Campos, O Século Esquisito, p. 205).

Roberto Campos, que praticamente ninguém conhece nos dias de hoje, foi um pensador liberal, diplomata, político, economista e homem de letras. Era uma das únicas vozes discordantes da “Constituição Cidadã” de 1988. Nasceu em 1917 e morreu em 2001. Era um ser de saber enciclopédico. Suas ideias foram sempre “em defesa do liberalismo e contra o comunismo, o socialismo e o esquerdismo de botequim”.

De iluminada inteligência, colaborou na criação da ONU e foi senador constituinte. Sabia o que dizia, pois participou e conheceu “as feras” que nos enganaram, porque viveu o momento.

Toda “curriola” que inventou a “constituição dos direitos” e passou esses direitos para seus descendentes, criando no Brasil uma “DINASTIA DE PODER”, tinha ódio a ele, saboreavam a vitória das esquerdas, o seu ápice, a tomada do poder no Brasil, vislumbravam a tomada de toda américa do sul através da conquista brasileira e colocaram em prática, pela primeira vez, a “estratégia da tesoura”, com o PT votando contra a Constituição.

Qualificou a vitória dessas ideias que hoje infernizam nossas vidas, como a “a vitória do nacional-obscurantismo”.

Os donos do poder tentaram e tentam de todo modo apagar suas obras e seu pensamento de nossa história. Seu livro mais famoso é “Lanterna na Popa”, está custando 224 reais no site Amazon.

Em um país onde ninguém lê, o preço da obra faz desistir da leitura.

Para finalizar, 4 pérolas de Roberto Campos:

“Continuamos a ser a colônia, um país não de cidadãos, mas de súditos, passivamente submetidos às ‘autoridades’ – a grande diferença, no fundo, é que antigamente a ‘autoridade’ era Lisboa. Hoje, é Brasília”.
“Nossa Constituição é uma mistura de dicionário de utopias e regulamentação minuciosa do efêmero”.
“O PT é um partido de trabalhadores que não trabalham, estudantes que não estudam e intelectuais que não pensam”.
“É divertidíssima a esquizofrenia de nossos artistas e intelectuais de esquerda: admiram o socialismo de Fidel Castro, mas adoram também três coisas que só o capitalismo sabe dar – bons cachês em moeda forte, ausência de censura e consumismo burguês. São filhos de Marx numa transa adúltera com a Coca-Cola”.

Precisamos, sim, de uma nova Constituição! Lute por isso! Vale a pena!

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Carlos Sampaio

Professor. Pós-graduação em “Língua Portuguesa com Ênfase em Produção Textual”. Universidade Federal do Amazonas (UFAM)

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