desktop_cabecalho

São Paulo completa 467 anos. Muito a lamentar, nada a comemorar (veja o vídeo)

Ler na área do assinante

A maior capital da América Latina, comemorou 467 anos, nesta segunda-feira (25), e o Jornal da Cidade Online recebeu a estarrecedora carta de uma moradora dessa megametrópole, lamentando mais um ano de vida dessa “linda e abandonada cidade”.

Abaixo, veja a íntegra da carta desesperadora da aposentada, que ela chama de “lamento”.

“Meus sentimentos a mais linda cidade do Brasil: São Paulo. Nada a comemorar. Só lamentar o abandono e descaso. Meus sentimentos, São Paulo.
Tenho 60 anos de idade e às custas de muito trabalho, comprei meu apartamento na rua Frei Caneca. Rua tranquila. muitas casas e casarões. O Sol, o vento e a claridade sempre foram presentes (no imóvel). A lua “fecha com chave de ouro”. Traz esperança de um amanhecer promissor. Muitas noites, inclusive, durmo com a janela aberta olhando pra ela. Mandei “telar” todas as janelas para deitar sentindo a brisa da vida: o ar.
Em frente ao nosso prédio, existia a Concessionária Sonnerving (Ford Frei Caneca). O último proprietário foi Ayrton Senna “do Brasil”. Após o falecimento dele, o terreno foi vendido. Foi nessa época que iniciou nosso martírio.
A incorporadora conseguiu aprovar a construção de empreendimento de três torres de 25 andares, cada uma. Uma espécie de Resort Residência.
Foram três anos de obra, 24 horas por dia. Muitas encrencas com polícia, moradores e trabalhadores. Nada amenizou o sofrimento.
Finalizada a construção, começou a tristeza: o sol, que dava “o ar da graça” o dia todo, passou a “entrar” até as onze horas. Passou a “agraciar” os apartamentos dos novos edifícios, por trás de uma das novas torres.
Muitas vezes, vi minha cachorra aproveitando o último “fio” do Sol... E isso tudo, justo durante a pandemia da Covid-19, quando fomos obrigados a nos recolhermos....
Em março de 2020, tivemos a surpresa da demolição da Villa Zeffiro, uma mansão do Século 19. Tratava-se de uma vilinha de asfalto de paralelepípedo, que era o espaço de uma galeria de artes, ateliê de costura, salão de beleza, agência de viagem e o casarão que, por sinal, se tornou o belo Restaurante Zeffiro.
O restaurante era bem frequentado. Mensalmente, eles faziam “a noite do chef”, na qual recebiam vários chefes e organizavam o evento. Os donos eram os que administravam a bela casa. “Entrem” no site do Restaurante Zeffiro e ficarão estarrecidos.
O fato é que a casa foi fechada e, em março, início da pandemia do coronavírus, começou a demolição do casarão, que se tornou um stand de vendas com corretores barulhentos.
Com todas as unidades vendidas, prosseguiu a demolição do prédio que acabou no mês passado: dezembro de 2020.
Pensem no caos que se tornou nossas vidas!! Calor, britadeira, marretas, gritos dos trabalhadores e muita, muita areia.
Idosos, bebês, animais... Grande parte dos moradores trabalhando em Home Office. Dormir e descansar? Como? Capitalismo selvagem “passando por cima” como rolo compressor.
Olho pela minha janela e fico observando o prédio vizinho: edifício Genêve, com sacada em todos os apartamentos. De um lado, foi construído o Shopping Frei Caneca, que emparedou um lado do prédio e deixou vinte e duas unidades voltadas para o paredão de cimento.
Como se não bastasse a falta de visão, o shopping ampliou “fazendo um L”, acabando com a vista dos apartamentos do fundo. Mas, pensamos: sobraram o lado esquerdo e a frente com vista. Porém, foi um ledo engano: o terreno foi vendido para a Vitacom, que deu início a um novo empreendimento que vai, literalmente, “fechar” nosso prédio em formato de “U”. Apenas as unidades de frente terão vista garantida (porque dão pra rua). Os demais estão fadados ao paredão de concreto.
Hoje, vivemos com as janelas encerradas. Mesmo assim, não conseguimos amenizar o barulho da obra que está a todo vapor dia e noite, incomodando toda vizinhança. O prédio emparedado, o Resort de frente, o nosso e mais um prédio da rua Itararé (que dá fundo para nova construção, também com sacada), todos vivendo o martírio.
Vejo muitos apartamentos que já foram desocupados. Infelizmente, não posso vender o meu porque fiz um termo de doação de uso-fruto. A lei não permite revogação.
E, durante esse suplício, reflito que o curioso é que não existe fiscalização por parte de nenhum órgão público. (Empresas de engenharia) Trabalham com um staff de poucos colaboradores. Colocam no corpo equipamentos de segurança, mas não estão presos a nada. Pobres coitados....
Quem compra apartamento com sacada para ter vista pro nada? Ou ter vizinhos “colados” na sua sacada ou janela? É passar a viver na penumbra. Tive amigos que moraram em apartamentos assim: não seca roupa no varal, não tem ventilação, tem que acender as luzes o dia todo e colocar antimofo nos armários.
Muitos moradores ficam deprimidos, tristes, sofrendo as consequências do descaso das autoridades. O pior é que, quando o barulho acabar, ficarão emparedados.
Quanto ao barulho, constatamos que não existe regra de horário, muito menos de ruído. Uma noite dessas, as máquinas estavam a todo vapor às 03 da madrugada. Acionamos a Polícia Militar. Moradores de todos os prédios desceram para reclamar. O militar disse que não tinha autoridade para intervir e que deveríamos fazer abaixo-assinado e efetuar boletim de ocorrência.
A demolidora já “limpou” o terreno. Esta semana, assisti o corte de uma seringueira centenária. Cada tronco serrado doía o coração. Como cortam uma árvore centenária?
Em questão de dias, teremos a Construtora da YO colocando suas máquinas para fundação do local. Pois, agora, é a vez do Edifício Valência com seus doze andares, “receber” o prédio vizinho de vinte pisos. O prédio começará a ser erguido, impedindo a claridade, sol, ventilação, lua, ausência de liberdade. Resultado do descaso e da falta de um plano diretor.
E as construções não param por aí, ao chegar no número 679, da Frei Caneca, mais um prédio de sacada na mesma situação: barulho, areia e a triste escuridão. Em um único quarteirão temos 4 novos prédios sendo levantados, todos com muitos apartamentos.
Quem tem autoridade para aprovar novas construções, sem sequer avaliar a qualidade de vida dos moradores? Não existe Plano Diretor para outras regiões que não seja ao lado das casas do Governador e Prefeito? A troco de quê se aprovam essas obras?
Nossa rua é estreita e já não suporta mais o trânsito (outro grande problema). O shopping tem nove salas de cinema, dois grandes teatros (Nair Belo e Frei Caneca), escola de cinema, televisão e teatro, o maior centro de convenções; onde recebe congressos de medicina, odontologia, etc...
As calçadas, além de estreitas, estão, totalmente, destruídas, cheia de buracos. Os cadeirantes não têm acesso para se deslocar. No mês de maio de 2020, fui vítima e sofri uma queda onde bati com a coluna na guia da calçada. Fui parar no pronto Socorro. Comemorar o quê no aniversário da cidade?
A avenida Paulista, antigo cartão postal da cidade, está um caos de ladrões de celular. Tem também os “panos” na calçada para venda de tudo o que se possa imaginar. O Vale do Anhangabaú foi, totalmente, concretado. O Parque Augusta está parado há anos e se tornou ponto para marginais se esconderem. Cada dia mais, as pessoas não têm onde passear com os cachorrinhos. As ruas, em torno, têm cacos de vidro, resultado da aglomeração de jovens que aparecem e “fecham” a rua Peixoto Gomide esquina da Frei Caneca. O lixo que fica é assustador.
Não temos como retornar para casa nas sextas, sábados e domingo, após as 20 horas até a madrugada. Me resta esperar para ver se terei força para enfrentar o “assassinato” da minha alegria de viver. E não estou sendo trágica! Nos resta esperar as máquinas. Uns dois anos de barulho, “enlouquecendo” qualquer um. Em seguida, a escuridão. A única coisa que se tem direito, dentro de casa, é a ventilação. Hoje, o maior prazer é chegar em casa e tirar a máscara e respirar, mas nem isso podemos: luzes acesas, máquinas de secar roupas, ventiladores, ar-condicionado, aquecedores, etc...
E o tema do aniversário da cidade, este ano, é: memória, saúde e bem-estar. De quem?
Vou me abster de comentar sobre a situação dos moradores de rua e “Cracolândia”, que fazem as necessidades nas ruas.
Senhor, como podemos comemorar Natal e Ano Novo?"

A Redação do JCO entrou em contato com a Regional da Sé, uma espécie de subprefeitura por bairro da capital. A funcionária Débora Chieffe informou que a equipe responsável pela área estava em "serviço na Cracolândia". Ela disse que deixaria a denúncia "sobre a mesa da área" e solicitou que a moradora ligasse no telefone geral 156 para "abrir protocolo de denúncia", que são redistribuídas por localidade atendida e encaminhadas para cada Regional averiguar.

Confira o vídeo:

Em tempos de "censura", precisamos da ajuda do nosso leitor.

Agora você pode assinar o Jornal da Cidade Online através de boleto bancário, cartão de crédito ou PIX.

Por apenas R$ 9,99 mensais, você não terá nenhuma publicidade durante a sua navegação e terá acesso a todo o conteúdo da Revista A Verdade.

É simples. É fácil. É rápido... Só depende de você! Faça agora a sua assinatura:

https://assinante.jornaldacidadeonline.com.br/apresentacao

da Redação Ler comentários e comentar