O tempo de envelhecer

01/05/2016 às 08:25 Ler na área do assinante

Sabedoria não é algo que dispomos para o nosso deleite, mas para servir e ministrar aos outros o que de Deus recebemos como dádiva maior. Não à toa que a sabedoria envolve, seduz, encanta, mas também, pode ser uma seta que machuca e fere, se for utilizada por alguém que em nome de sua prepotência, arrogância, ouse humilhar e destruir seu próximo. Os livros, são sábios conselheiros, mas a sabedoria que vem do Alto, é pura, sublime e nos enche de prudência e zelo diante das escolhas que fazemos e das decisões que haveremos de tomar. Gosto da simplicidade de quem sabe. Quando percebo gente assim, cada vez me convenço que o ato de saber, é dádiva que Deus reparte para quem Nele confia. 

Todos vamos envelhecer... Querendo ou não, iremos todos envelhecer. As pernas irão pesar, a coluna doer, o colesterol aumentar. A imagem no espelho irá se alterar gradativamente e perderemos estatura, lábios e cabelos. A boa notícia é que a alma pode permanecer com o humor dos dez, o viço dos vinte e o erotismo dos trinta anos. O segredo não é reformar por fora. É, acima de tudo, renovar a mobília interior: tirar o pó, dar brilho, trocar o estofado, abrir as janelas, arejar o ambiente. Porque o tempo, invariavelmente, irá corroer o exterior. E, quando ocorrer, o alicerce precisa estar forte para suportar. Erótica é a alma que se diverte, que se perdoa, que ri de si mesma e faz as pazes com sua história. Que usa a espontaneidade pra ser sensual, que se despe de preconceitos, intolerâncias, desafetos. Erótica é a alma que aceita a passagem do tempo com leveza e conserva o bom humor apesar dos vincos em torno dos olhos e o código de barras acima dos lábios. Erótica é a alma que não esconde seus defeitos, que não se culpa pela passagem do tempo. Erótica é a alma que aceita suas dores, atravessa seu deserto e ama sem pudores. Aprenda: bisturi algum vai dar conta do buraco de uma alma negligenciada anos a fio. ("Erótica é a Alma”)”

Os anos enrugam a pele, mas a renúncia a um ideal enruga a alma. As preocupações, as dúvidas, os temores e as desesperanças são os inimigos que, lentamente, nos fazem vergar para o chão e nos convertem em pó antes da morte (General Douglas Mc Artur).

Não é preciso enganar-se, fazer de conta de que o tempo não passou, nem cair em depressão diante das dificuldades que o avançar da idade impõe. Basta encarar com naturalidade. Começamos a morrer tão logo nascemos, é a dialética da vida. Os jovens não estão isentos do sofrimento e as dores do tempo não são exclusividade dos idosos. “Mas incomoda”, dizes, “ter a morte em vida.” 

Em primeiro lugar, ela está sempre presente, quer para o velho ou para o jovem – e não se trata aqui de consenso surgido de uma votação. Depois, ninguém é tão velho que não possa reivindicar para si mais um dia. “Um dia é um degrau na vida”. (SÊNECA. Aprendendo a viver. São Paulo: Martins Fontes, 2008, p. 34.)

Simone de Beauvoir em seu livro clássico sobre a velhice mostra, entre outras coisas, que o inconsciente não tem idade e que temos forte tendência a nos comportar, na velhice, como se jamais fôssemos velhos: aos 60 anos, raros são os que se consideram nessa condição e mesmo depois dos 80 anos há muitos que acreditam ser de meia-idade e uns tantos que continuam a se achar jovens.

Como escreve Cícero, em seu famoso tratado De Senectute (Da velhice),

"Todos querem chegar à velhice; quando chegam, acusam-na". E ainda: "Torna-te velho cedo, se quiseres ser velho por muito tempo". Pensamentos que ressoam, no século XVII, no dito de Swift e que, de certo modo, vão na mesma direção dos dados do livro de Simone de Beauvoir: "Todos desejam viver por muito tempo, mas ninguém quer chegar a ser velho".

A depender das circunstâncias, talvez seja melhor não chegar à velhice, não se ver no espelho nem vegetar. 

Vale a pena continuar vivendo quando perdemos o domínio mais elementar sobre o nosso corpo? Não podemos fugir à morte, mas é possível transformar o tempo em nosso amigo? Não advogo o suicídio nem recrimino a velhice. Esta tem algo de belo e positivo. 

Em qualquer caso, o tempo deixa marcas indeléveis em nosso rosto, em nosso corpo. Ele não nos perdoará e cumpriremos o ciclo da vida. Melhor nos resignarmos a esta verdade absoluta.

A medida da vida está em olhar para si mesmo e contabilizar não o tempo, mas as ações e as relações humanas construídas. Se olharmos para trás e sentirmos que valeu a pena viver, então a vida foi plena. Por que, então, temer a velhice? A morte não escolhe idade, por que temê-la?

Pio Barbosa Neto

Professor, escritor, poeta, roteirista

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Pio Barbosa Neto

Articulista. Consultor legislativo da Assembleia Legislativa do Ceará

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