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Liberdade de expressão e inviolabilidade parlamentar... Mas, o único flagrante é o de abuso de autoridade

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Sou advogado há quase 40 anos e fui professor de Direito durante duas décadas. Embora siga sendo sempre estudante, conheço um pouco das entranhas das ciências jurídicas.

E vou expressar minha opinião tentando fugir do rigor técnico que sempre envolve as polêmicas no mundo jurídico.

Pois então, a primeira variável a ser analisada no caso da “prisão em flagrante” do Deputado Federal Daniel Silveira é a questão da sua imunidade parlamentar.

A jurisprudência (conjunto de julgamentos que dão direção e sentido ao posicionamento de uma Corte) do Supremo Tribunal Federal, baseada na interpretação dos artigo 51 da Constituição Federal (liberdade de expressão típica da atividade parlamentar) combinado com o artigo 53 (“caput”) da Constituição Federal (imunidade parlamentar) e com as disposições da Emenda Constitucional 35/2001, são firmes no sentido de entender que a inviolabilidade de parlamentares no Parlamento ou fora dele não é absoluta.

Ou seja, reiteradas vezes o STF tem decidido que os Deputados Federais podem responder civil e penalmente por suas manifestações quando ultrapassam os “limites da civilidade”, “agridem a honra ou a dignidade alheia” ou são usadas para “difundir discursos de ódio, violência e discriminação”.

A bem da verdade, pela simples leitura isolada destes enunciados, a prisão “em flagrante” do Deputado Daniel Silveira, aparentemente, estaria justificada e seria legal.

Mas não é!

Em primeiro lugar admito que o Parlamentar foi extremamente contundente. Contudo, o seu decreto prisional é nulo, abusivo e uma afronta ao que chamamos de “devido processo legal”. Explico. A rigor não há flagrante. E, se não há flagrante, não poderia haver a prisão.

Tanto não há flagrante que o ministro que ordenou sua custódia emitiu um “mandado de prisão”.

Se há “mandado de prisão”, ela não se deu em flagrante.

Neste ponto a ordem de prisão é tão estapafúrdia que sequer comporta maiores divagações. E mais, o decreto prisional foi dado num processo que é nulo de pleno direito desde o seu nascimento. Em Direito se diz que é um processo morto “ab ovo”, ou seja, na casca.

É que tudo está acontecendo no seio de um inquérito que foi aberto de forma assustadoramente ilegal e abusiva pelo próprio ministro que se diz vítima das palavras do Deputado e conduzido também por ele. Ou seja: o ministro é ao mesmo tempo o inquisidor (esse é o adjetivo) dos fatos, é quem processa a investigação e é quem vai julgar quem acusa de serem seus ofensores.

Em outras palavras, não há processo isento, não há juiz neutro, nem julgamento minimamente justo.

A Constituição Federal estabelece claramente que a prerrogativa de acusar a alguém criminalmente é de competência exclusiva do Ministério Público. A isso chamamos de “princípio da provocação”.

No caso do inquérito onde ocorreu a prisão do Parlamentar e de outros “indiciados”, por mais absurdo que possa parecer, não há a participação do Ministério Público. Ou seja, a Procuradoria Geral da República que é quem teria que provocar o Judiciário para conhecer, processar e julgar os fatos, não requereu a abertura deste inquérito.

Estamos, por isso, diante de um caso gravíssimo de usurpação de competência processual que inclusive já foi reconhecida e levantada formalmente pela Procuradoria Geral da República que requereu o arquivamento do inquérito sob o fundamento da sua total nulidade, no que não foi atendida pelo Supremo Tribunal Federal.

Não fosse isso, estamos diante de uma Corte que merece respeito, mas que é integrada por ministros que não se fazem respeitar.

O direito de crítica do parlamentar poderia sim, ser objeto de uma averiguação mais profunda através de uma investigação que obrigatoriamente teria que iniciar na Procuradoria Geral da República, ou perante o próprio Parlamento, que tem em seu Regimento Interno, mecanismo para aferir o comportamento e decoro dos seus pares.

Ao insistir na abusividade intolerável da sua autoridade, o ministro e os demais integrantes do STF, o que fazem é aumentar a já insuportável percepção por parte da sociedade civil e dos dois outros Poderes da República, que agem reiteradamente como se fosse um poder verdadeiramente autônomo, soberbo e soberano, que se põe acima da Constituição que tem o dever de guardar, cumprir e dar vigência.

Estamos diante de uma Corte Constitucional que não observa limites. Que julga em causa própria, contaminada por ministros sobre os quais recaem graves indícios de práticas nada republicanas.

É bem por isso, pela má postura dos seus integrantes, que a Instituição sagrada e Suprema vem sendo tão atacada, criticada e enfrentada em suas deliberações pendulares, inconsistentes e incoerentes com a norma Constitucional escrita.

Isso trás uma grande desconfiança e insegurança para a Nação, expondo todos a uma sensação verdadeira de absoluta falta de estabilidade institucional.

Tenho para mim que a prisão do Deputado Federal Daniel Silveira será derrubada pelo plenário da Câmara dos Deputados. E isso será vergonhoso para o STF.

E penso que mais do que nunca é chegada a hora de expor as entranhas de alguns dos ministros a processos de investigação das suas atitudes, as quais somente pelo fato de serem extraordinariamente abusivas dos seus direitos do uso de autoridade, já constituem por si mesmas numa flagrante ilegalidade que precisa receber e conhecer limites.

Não podemos esquecer as palavras que são sinônimos de abuso, tais como: afronta, agravo, arrogância, atrevimento, cinismo, desacato, desaforo, desavergonhamento, descaramento, desfaçatez, desplante, desvergonhamento, insolência, petulância, ultraje, arbitrariedade, despotismo, prepotência.

E que todas elas não deixam de ser uma grave e violenta ofensa à ordem institucional.

É hora do Senado da República usar das suas prerrogativas republicanas e pensar em podar as asas de quem está voando por sobre os limites do seu cercadinho, sob a falsa impressão de serem os detentores de poderes sem fim. Sempre observando rigorosamente as regras democráticas do Estado de Direito. Antes que a maionese desande...

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Luiz Carlos Nemetz

Advogado membro do Conselho Gestor da Nemetz, Kuhnen, Dalmarco & Pamplona Novaes, professor, autor de obras na área do direito e literárias e conferencista. @LCNemetz

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