desktop_cabecalho

Nesta CPI da Covid os senadores querem que as testemunhas emitam juízo de valor. Isso é ilegal. É constrangedor

Ler na área do assinante

É estarrecedor para os processualistas, e constrangedor para as testemunhas que já prestaram depoimento nesta CPI do Senado, ver os senadores submeterem as testemunhas às inquisições sobre juízo de valor.

Parem com isso, senhores senadores. Instruam-se.

Recorram aos seus assessores que conheçam um pouquinho só (não precisa conhecer muito) de processo civil e processo penal, para saber deles se testemunha está obrigada a externar juízo de valor sobre qualquer coisa, sobre qualquer assunto, sobre qualquer pessoa.

Testemunha só fala sobre fatos. Só depõe sobre fatos.

Testemunha alguma vai depor em juízo ou fora dele sobre "achismo".

Testemunha não emite conceito sobre coisa alguma. Subjetivismo e testemunho/testemunha são incompatíveis. Testemunha não acha nada. Testemunha nada pode dizer, sobre a valorização de algo.

Se o presidente agiu ou age certo em não querer usar máscara, isto é pergunta constrangedora e exige da testemunha externar juízo de valor.

Também é juízo de valor responder às perguntas sobre a correção ou incorreção das ações do presidente, do governo, de seus ministros e de quem quer que seja sobre o combate à pandemia.

Repita-se: testemunha apenas tem o dever de responder e dizer a verdade sobre fatos. E juízo de valor não é fato.

O acerto ou não do governo no combate à pandemia é juízo de valor.

Cada um tem a sua opinião. Cada um tem a sua valorização.

Senhores senadores, em respeito à exatidão, à isenção, à legalidade, em respeito a quem vai depor, leiam, antes, os artigos 450 a 463 do Código de Processo Civil, fonte subsidiária ao Código de Processo Penal. E leiam os artigos 202 a 225 do próprio Código de Processo Penal.

Toda CPI deve pautar-se pelas disposições destes dois códigos processuais. E estes são os artigos que tratam especificamente das testemunhas, quem pode ser, como deve ser tomado o depoimento, e muito mais.

Quem emite juízo de valor, na Justiça, é o magistrado quando sentencia o processo. Já nas CPIs, quando ao final dos trabalhos. O relator elabora o seu relatório e submete à votação que poderá ser ou não aprovado. Se não for, outro senador será indicado para elaborar o relatório. Terminada a CPI, com a votação do relatório, tudo é enviado à Procuradoria Geral da República.

Isto porque só o chefe da PGR é quem tem poder e legitimidade para tomar qualquer providência legal junto ao Judiciário em razão do que contém o relatório.

Foto de Jorge Béja

Jorge Béja

Advogado no Rio de Janeiro e especialista em Responsabilidade Civil, Pública e Privada (UFRJ e Universidade de Paris, Sorbonne). Membro Efetivo do Instituto dos Advogados Brasileiros (IAB)

Ler comentários e comentar