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Quando o liberalismo do NOVO e do MBL é negociável

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Os expoentes da direita menchevique adoram criticar o presidente Bolsonaro com a repetição das mesmas groselhas de sempre. Elas são inumeráveis e geralmente desconectadas do mundo real. A mais corriqueira delas é a que ele traiu pautas historicamente defendidas e mudou completamente depois de chegar à presidência da República.

De fato, o presidente Bolsonaro mudou em alguns quesitos. Se antes a retórica lavajatista era parte importante da sua plataforma, hoje ele se afastou completamente dela e de seus ardorosos defensores. Isso não é algo ruim: a Lava Jato abriu uma Caixa de Pandora no Judiciário brasileiro, precedente utilizado nos supremos inquéritos persecutórios. Em nome do combate à corrupção e ao crime, vale tudo, até mesmo cometer inúmeras ilegalidades e jogar o devido processo legal no lixo.

Sua relação com o liberalismo econômico sempre foi conflitante, com algumas iniciativas que me desapontaram pessoalmente. É aqui que os liberais costumam atacá-lo. Dizem que Bolsonaro utilizou a plataforma liberal com fins puramente eleitoreiros. Esquecem convenientemente que os princípios liberais foram desprezados por eles próprios para alimentar o antibolsonarismo juvenil – e os exemplos não são poucos.

O liberalismo brasileiro é essencialmente direitista pela ênfase maior na defesa da economia de mercado, nas privatizações e na menor interferência possível do Estado no campo econômico. Quando se pensa no melhor que o liberalismo já teve em solo tupiniquim, o nome do saudoso Roberto Campos é uma lembrança automática. Ele é um símbolo, uma luz nas trevas estatizantes tipicamente brasileiras – e latino-americanas também – por sua defesa eloquente do capitalismo de livre iniciativa.

Qualquer liberal deve – ou deveria – ter ojeriza ao dirigismo estatal, e por consequência abraçar as iniciativas que tirem as garras governamentais da economia. O sr. João Amoêdo, cacique do Partido Novo, surgiu na política defendendo precisamente isso. Mas ele deixou de lado o liberalismo econômico para criticar a redução do ICMS (imposto sobre circulação de mercadorias e serviços) proposta pelo presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), com o objetivo de diminuir o preço dos combustíveis. O motivo alegado foi a perda de arrecadação de estados e municípios com a iniciativa, além do não uso dos R$ 24 bilhões perdidos pelos entes federativos para ajudar os mais necessitados.

Conversa para boi dormir. Amoêdo criticou a medida não pelos motivos alegados, mas por uma única razão: ela foi proposta por Arthur Lira, que chegou à presidência da Câmara com o apoio do presidente Bolsonaro. Ou seja, se tal medida tem as digitais de Bolsonaro, automaticamente ela é ruim, mesmo que esteja de acordo com a plataforma liberal. É o antibolsonarismo infantil elevado à enésima potência.

Igualmente importante para o liberalismo é a defesa da liberdade de expressão. É algo tão óbvio que nem merece maiores considerações, pois está presente em todas as suas variantes possíveis. Digo isso por ter começado com o exemplo da liberdade econômica, uma pauta não consensual entre os liberais. O liberalismo americano, por exemplo, tomou para si o legado revolucionário francês e defende um capitalismo enxotado de regulamentações – modelo que irá desaguar na social-democracia nos moldes europeus.

Já a liberdade de expressão é sagrada para qualquer liberal. Pois temos no Brasil um ambiente hostil aos conservadores, com perseguições perpetradas no Judiciário e nas Big Techs contra indivíduos, pautas e opiniões. Os supremos inquéritos prendem qualquer um que cometa a heresia de ferir as sensibilidades dos deuses togados. A situação é completamente absurda, além de ilegal. Não para o sr. João Amoêdo. Em diversas oportunidades ele defendeu o STF e suas ações ilegais, chegando ao ponto de reverberar a narrativa do establishment sobre o tal ‘’gabinete do ódio’’ e os ‘’atos antidemocráticos’’.

O mesmo João Amoêdo classificou como ‘’censura’’ a decisão do ministro Alexandre de Moraes que retirou de circulação uma edição da Revista Crusoé. O duplo padrão é óbvio – e o motivo mais ainda. No caso dos inquéritos ilegais, os alvos são conservadores que apoiam o presidente Bolsonaro, considerado por ele um completo abominável. Ou seja, a defesa da liberdade de expressão depende de quem a exerce, não do princípio em si. Quando interessa, ela é válida. Quando não, vira ‘’crime de opinião’’.

Nesses posicionamentos o sr. Amoêdo foi seguido por muitos filiados e políticos do Partido Novo. Não é uma mera opinião isolada. Ele é o símbolo de um partido considerado o suprassumo do liberalismo, tendo a sua posição uma relevância dentre os seus partidários – parando por aí, é claro. Tanto Amoêdo quanto os novistas gostam de monopolizar o liberalismo quando é conveniente, pois uma simples mudança de situação é suficiente para descartá-lo sem nenhum pudor.

Outro grupo que vai na mesma toada é o MBL. Assim como os partidários do NOVO, seus integrantes amam monopolizar o liberalismo. Ambos insistem em outra narrativa igualmente gasta: Bolsonaro se vendeu para o Centrão. Tal diagnóstico é utilizado para achincalhar o presidente da República e colocá-lo no rol dos corruptos engravatados.

Mas o sr. Renan dos Santos – cacique do MBL e um dos maiores reprodutores da supracitada narrativa – defendeu a governabilidade com o Centrão em 2019 ao falar sobre a Reforma da Previdência. Na época, o presidente Bolsonaro era criticado por não estabelecer diálogo com o Congresso. Após fazer o que era defendido por Renan, ele virou alvo das críticas mais ácidas possíveis.

São esses senhores que gostam de apontar o dedo aos bolsonaristas e apontarem incoerências. Eles dizem que o presidente Bolsonaro mudou e seus apoiadores são petistas de sinal trocado. Não percebem – ou fingem não perceber – que eles são os incoerentes da história ao desprezarem suas pautas em nome do antibolsonarismo. Por ele vale tudo, até mesmo negociar o outrora inegociável liberalismo.

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Carlos Júnior

Jornalista

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