desktop_cabecalho

Celso Daniel, o fantasma que teima em retornar do passado

Ler na área do assinante

Ninguém sabe ao certo os detalhes e motivos que levaram ao assassinato do ex-prefeito de Santo André, Celso Daniel, há exatos 20 anos – uma coisa todos concordam, as conclusões do inquérito não passam nem perto da realidade, tamanho o número de evidências, testemunhas e até homicídios ligados ao caso, deixados de lado.

A última delegada a assumir o midiático inquérito foi Elisabete Sato. Apesar da montanha de cadáveres, ela concluiu o inquérito com apenas cinco páginas. Talvez seja um recorde mundial. O primeiro inquérito policial com menos páginas do que vítimas fatais (foram 7 mortes suspeitas e apenas 5 páginas) – e nesse inquérito ela concluiu que se tratava de ‘um crime comum’, um sequestro que deu errado. Mesmo que os criminosos nunca tenham pedido resgate e diante das evidentes marcas de tortura no corpo do ex-prefeito.

A última movimentação do processo aconteceu em 2016  (divulgada pela revista VEJA, à  época), quando o procurador de Justiça Edílson Mougenot Bonfim citou suspeitas da existência de mandantes do assassinato do ex-prefeito, no pedido de retomada das investigações endereçado ao chefe do Ministério Público de São Paulo, procurador-geral Gianpaolo Poggio Smanio. Na petição elaborada por Bonfim, até então mantido em sigilo, ele sugere que a denúncia criminal seja ampliada para apontar novos responsáveis pela morte.

Em reunião de cúpula do MP, o material foi encaminhado pelo procurador-geral ao Grupo de Atuação Especial de Repressão ao Crime Organizado (Gaeco). A unidade do Gaeco no ABC paulista mantém um inquérito aberto desde 2005 para apurar “eventuais partícipes” na morte de Celso Daniel.

Para substanciar a reabertura do inquérito o procurador de Justiça, Edílson Mougenot, argumentou:

"Considerando pela logística do crime de homicídio que vitimou Celso Daniel com o necessário emprego de virtuosos recursos e engenhosos Meios baseado no surgimento de provas novas e, ainda, lastreado em "máxima de experiência" usamos dizer que afundada suspeita de que tenha havido um número maior de mandantes além daquele apontado inicialmente nos autos.
Considerando, especialmente a revelação de Marcos Valério da Silva prestada na décima terceira vara criminal federal de Curitiba de que foram procurado por Silvio Pereira, ex-secretário geral dos partidos dos trabalhadores para que providenciasse o pagamento de 6 milhões de reais a Ronan Maria Pinto em Santo André portanto esse estaria chantageando o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva José Dirceu e Gilberto de Carvalho em "razão do crime de Celso Daniel" (...) outros dados indicativos reveladores de operações fradulentas para o pagamento da chantagem, indicou que José Carlos Boom lá e, então amigo próximo de Luiz Inácio Lula da Silva mediante empréstimo fraudulento tomado ao banco Schaim e com intermediação do ex-ministro José Dirceu, levantou 12 milhões, dos quais repassou metade para Ronan Maria Pinto (o chantageador). 
Para falar do crime politico mais suspeito do Brasil, temos que relembrar a sucessão, digna de filme, de homicídios que a Secretaria de Segurança Pública sob comando do PSDB, na época, resolveu não ver."

Só em 2016 – 14 anos depois do assassinato – um juiz da 1ª vara da Fazenda Pública  de Santo André, Genilson Rodrigues Carreira, sentenciou o  PT – sim, sempre eles, o Partido dos Trabalhadores – condenou o PT a devolver R$ 3,5 milhões aos cofres públicos, por considerar procedente a denúncia do Ministério Público de que o partido teve participação em um esquema de corrupção e cobrança de propina no sistema de transporte público da cidade durante a gestão do prefeito Celso Daniel, morto em 2002.

O partido também foi condenado ao pagamento de multa equivalente a três vezes o valor do acréscimo patrimonial, ou seja, R$ 10,5 milhões, e proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou de crédito por dez anos.

A suspeita mais óbvia de motivação para a execução de Celso Daniel era exatamente o controle do 'propinoduto' vindo do transporte público da prefeitura de Santo André. E novamente temos a insólita situação envolvendo o PT num mega esquema de corrupção onde instituições são condenadas, mas não as pessoas físicas que operavam. 

Isso se repetiria na Lava-Jato onde o próprio presidente do STF, Luiz Fux, reconhece que houve corrupção de proporções bíblicas na Petrobras, mas o principal responsável, apontado por testemunhas, provas materiais e condenado por 20 magistrados, o ex presidente Lula foi ‘descondenado’.

Voltando ao assassinado de Celso Daniel, como seria possível concordar com a Delegada Elisabete Sato que foi crime comum, quando sete (isso mesmo, sete!) pessoas envolvidas no crime, testemunhas ou que involuntariamente presenciaram qualquer fato relacionado, foram executadas ou apareceram mortas, mesmo depois que os supostos culpados estavam presos. Veja um resumo da sucessão de assassinatos.

Mortes relacionadas ao caso Celso Daniel:

- Dionisio Severo fugiu de helicóptero de um presídio em Guarulhos. Foi regatado por Cleiton, o Bola, e seu filho menor de idade Meses depois, foi preso por assalto a banco no em Alagoas – ele prometeu contar tudo sobre a morte de Celso Daniel em troca de um acordo com a justiça. Foi morto no parlatório do presidio em frente sua advogada, com mais de 60 facadas a maioria nos glúteos – na linguagem penitenciaria, só os delatores, os alcaguetes são esfaqueados nas nádegas. (outro preso, o Cleiton Bola, fugiu nesse mesmo dia com Dionísio).
- Sérgio Orelha escondeu Dionisio em sua casa por alguns dias quando ele fugiu do presidio. Foi morto e encontrado carbonizado  num carro – caso nunca foi investigado.
- Otavio Mercier, policial civil do DENARC que manteve intenso contato telefônico com o criminoso, Dionísio, enquanto esse estava preso. Mercier foi morto a tiros dentro de casa.
- Iram Moraes Redua, agente funerário que resgatou o corpo de Celso Daniel foi morto por dois tiros. Foi assassinado dois dias depois com dois tiros nas costas.
- Garçom Antonio Palacio de Oliveira, era o garçom habitual de Celso Daniel e seu segurança, “Sombra’. Detalhe depois de sua morte a polícia apurou que alguém tinha feito um deposito em dinheiro na conta do garçom de R$ 60.000,00 (o equivalente hoje a R$ 235 mil reais). mesmo sem ter tido nada furtado, o polícia registrou a ocorrência como “roubo seguido de morte”!?!
- Um outro garçom, Paulo Henrique Brito, testemunhou o assassinato de Antônio. Vinte dias depois Brito foi assassinado com um tiro nas costas no mesmo local.
- Carlos Delmonte Printes médico legista também foi morto por sufocamento causado por injeção de remédios. Foi ele quem fez o laudo provando que Celso Daniel foi brutamente torturado. Delmonte deu uma entrevista ao programa de Jô Soares, à época de grande audiência onde ele relatou várias irregularidades. Inclusive que o necrotério foi invadido por vários deputados, ele chegou a citar o nome do então deputado Luiz Eduardo Greenhalgh, do PT. Uma semana depois dessa entrevista depois ele foi encontrado morto de forma suspeita.

Esse é de longe o crime mais complexo dos nossos 197 anos como país independente. Classificar essa sequência de homicídios como ‘crime comum’ é uma ofensa à nossa inteligência.

Todas essas histórias e muito mais estão no livro "Celso Daniel: Política, corrupção e morte no coração do PT", do corajoso jornalista Silvio Navarro.

Caso queira saber tudo sobre o assunto, clique no link abaixo:

https://bibliotecaconservadora.com.br/products/celso-daniel-politica-corrupcao-e-morte-no-coracao-do...

Foto de Eduardo Negrão

Eduardo Negrão

Consultor político e autor de "Terrorismo Global" e "México pecado ao sul do Rio Grande" ambos pela Scortecci Editora.

Ler comentários e comentar