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O que esperar das reformas

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Enquanto o IBGE informa ao povo brasileiro que além dos 13,5 milhões de desempregados existem mais de 6 milhões de subempregados, Michel Temer, movimentando os dedos em pose bem ensaiada, afirma que o país está saindo garbosamente da crise econômica. Henrique Meirelles, o poderoso representante do sistema financeiro, abrindo a “caixa de Pandora” do governo, desmente explicitamente o enfraquecido Presidente, que conta com apenas 5% de aprovação popular.

Consta na mitologia grega que Pandora foi a primeira mulher criada por Zeus, que a presenteou com um jarro (caixa) que continha todos os males do mundo e a “esperança”, recomendando-lhe que jamais a abrisse. Ela, curiosa, abriu a “caixa" e libertou todas as maldades, mas não deixou a esperança escapar.

O Congresso Nacional, manipulando o Executivo, é perdulário e criativo para soltar maldades. A última é a esdruxula “reforma política” que pretende criar o “fundão eleitoral” no valor inicial de R$ 3,6 bilhões. Como o velho Fundo Partidário e a propaganda gratuita de rádio e TV permanecem em vigor, o total previsto para as eleições de 2018 ultrapassam R$ 6 bilhões. Para tanto, o governo também fez uma redução de R$ 10 no salário mínimo. O valor que será economizado no corte do SM é exatamente o necessário para cobrir o novo fundão. Os senadores, descaradamente, afirmam que R$ 2 bilhões seriam suficientes para a “farra eleitoral”.

Por outro lado, enquanto a nação se afunda no déficit primário (receita menos despesa, sem contar a despesa com juros da dívida), previsto em R$ 159 bilhões para 2017, Temer remunera os deputados com a liberação de generosas emendas parlamentares. A educação e a saúde não são prioridades. Na questão de segurança pública transformaram as Forças Armadas em forças auxiliares das PMs estaduais.

O poderoso Henrique Meirelles (ex-presidente internacional do BankBoston, ex-deputado federal pelo PSDB, ex-presidente do Banco Central, ex-presidente do Conselho de Administração da J&F Investimentos, ex-membro do Conselho de Administração da Azul Linhas Aéreas Brasileiras e atual ministro da Fazenda), guardião da chave da “caixa de Pandora” tem como preocupação maior o pagamento mensal da dívida pública, exigência dos banqueiros.

Pela avaliação do FMI a dívida interna e externa da União, Estados e municípios, considerando os títulos do Tesouro Nacional negociados pelo Banco Central, é de 87,8% do PIB (soma de tudo que é produzido no país). A despesa brasileira com pagamentos de juros é de aproximadamente 7% do PIB, mais do que o aplicado em educação. Meirelles não abre mão desse compromisso assumido com os rentistas do mercado financeiro e os governadores querem mais empréstimos para seus Estados.

Para que haja superávit primário a receita deveria crescer acima da despesa por vários anos consecutivos. Os dados oficiais demonstram que tal fenômeno só ocorrerá em 2023, se o crescimento econômico for superior a 2% ao ano, a partir de 2018. A insaciável ganância dos políticos dificilmente permitirá que tal coisa aconteça com facilidade, uma vez que eles querem cada vez mais recursos públicos para uso pessoal.

Para Bresser Pereira, um dos fundadores do PSDB, ex-ministro de Itamar Franco e de Fernando Henrique Cardoso, “Há três grupos privilegiados no Brasil: o grupo dos rentistas, que vivem de juros e recebem quase 7% do PIB, quando deviam receber no máximo 2%. Tem 4%, 5% do PIB, uma barbaridade de dinheiro, que é roubado do patrimônio público e entregue a rentistas e financistas. O segundo grupo é o dos altos burocratas, que têm salários altos e aposentadorias excessivas. E o terceiro é o grupo dos interesses estrangeiros, porque tudo é feito aqui no Brasil em função dos interesses estrangeiros, e vamos nos transformando aos poucos em meros empregados dos países ricos”. O economista, como bom tucano, não fala nos privilégios dos políticos e defende a privatização das empresas estatais para cobrir os rombos.

Tentando um milagre, o mago da Fazenda desengavetou uma antiga proposta dos economistas acadêmicos descomprometidos com os interesses partidários (que ele não aceitava quando presidente do BC) e trouxe a lume a proposta de ajustar a taxa de juros cobrada pelo BNDES aos seus beneficiados (Medida Provisória 777). Atualmente o Tesouro capta dinheiro no mercado à taxa de 9,25% e repassa ao banco público que empresta aos empresários à taxa de 7%. É um belo presente que os brasileiros (pagadores de impostos) fazem aos capitalistas empreendedores. Ana Paula Leitão diz que o “BNDES chegou a captar recursos no mercado com juros de mais de 15% para emprestar a menos de 5% às empresas amigas como JBS/J&F e Odebrecht”.

Essa diferença de taxa de juros do BNDES resultou em uma bilionária dívida que será paga pelo contribuinte brasileiro em até o ano de 2040, no mínimo. Os políticos não se preocupam com isso, contanto que mantenham seus ganhos em “doações para suas campanhas eleitorais”.

O governo propõe a criação da taxa de longo prazo (TLP) para substituir a TJLP igualando a taxa do BNDES com a taxa de mercado, elevando os juros do banco estatal em 2,25%, o que geraria uma economia em torno de R$ 100 bilhões aos cofres públicos. O deputado federal Betinho Gomes (PSDB) acredita que “Isso diminuirá a dívida pública, permitirá a distribuição democrática de crédito e a diminuição da taxa de juros estrutural da economia, entre outros benefícios”. A tendência é essa, mas acontece que a TLP, se a MP for aprovada, só assumirá o mesmo valor que a TJLP após cinco anos, portanto só teria um novo valor em 2023, no meio do mandato do substituto de Michel Temer.

O financista Luiz Cezar Fernandes, criador dos bancos Garantia e Pactual, atualmente sócio da Grt Partner, adverte: “O crescimento da dívida pública atingirá 100% do PIB já na posse do novo governo (janeiro de 2019), gerando uma incompleta ingovernabilidade”. Isso seria a falência do atual sistema financeiro, atingindo as grandes instituições bancárias que, nesse caso, tentariam impedir que os clientes saquem suas poupanças à vista e a prazo.

O interessante é que Meirelles, hoje no PSD, é um dos postulantes ao cargo, com o apoio do mercado financeiro internacional. Também é bom relembrar a crise norte-americana de 2008.

Foto de Landes Pereira

Landes Pereira

Economista e Professor Universitário. Ex-Secretário de Planejamento da Prefeitura de Campo Grande. Ex-Diretor Financeiro e Comercial da SANESUL. Ex-Diretor Geral do DERSUL (Departamento Estadual de Estradas de Rodagem). Ex-Diretor Presidente da MSGÁS. Ex-Diretor Administrativo-Financeiro e de Relações com os Investidores da SANASA.

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