Como o Governo Lula transforma a miséria em ferramenta de perpetuação no poder

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Promessas não matam a sede. E no Nordeste, o povo ainda espera pela água enquanto o governo federal irriga milhões em contratos para ONGs com laços políticos estreitos. Em vez de garantir soluções estruturais, o governo Lula parece usar a miséria como ferramenta de perpetuação no poder e o semiárido como curral eleitoral.

Em 2023, o Ministério do Desenvolvimento Social destinou R$ 640,1 milhões à ONG Associação Um Milhão de Cisternas (P1MC), presidida por dois filiados históricos ao PT. Esse repasse representou 85% de todo o orçamento federal para o programa de cisternas. Em vez de executar diretamente as obras, a P1MC subcontratou 37 outras entidades, muitas também com vínculos partidários. Entre elas estão a Cootapi (PI), que recebeu R$ 9 milhões para construir 775 cisternas; a Cecor (PE), com R$ 6,4 milhões; o Instituto de Formação Cidadã (PE) e o Centro de Agroecologia do Semiárido (PE), ambos com R$ 3,4 milhões; e a Comtacte (CE), que levou R$ 4,6 milhões para construir 769 cisternas.

Essas entidades, juntas, receberam R$ 152 milhões. Não por mérito técnico, mas por afinidade política, como se o acesso à água fosse privilégio de militância. Relatórios da Controladoria-Geral da União (CGU) revelam que 31% das cisternas entregues entre apresentavam falhas estruturais. Dez por cento estavam completamente inutilizáveis. Famílias pobres receberam estruturas que não armazenam água — receberam ilusão. O Ministério nega influência político-partidária na seleção das entidades e promete fiscalização. Mas a realidade mostra outra coisa: o dinheiro escorre por redes alinhadas ao governo, sem controle efetivo e sem critério técnico transparente.

Enquanto isso, a Transposição do Rio São Francisco — obra fundamental para garantir segurança hídrica ao Nordeste — foi deixada em segundo plano. Lula prometeu a conclusão do projeto até 2026, afirmando que “faltava pouquinha coisa”. Mas a realidade é bem diferente. Dos 699 km totais, apenas 548 km estão concluídos. O Ramal do Apodi, por exemplo, está com apenas 27% das obras prontas, com previsão de entrega empurrada para 2025. A Estação de Bombeamento 3 (EBI-3), em Salgueiro (PE), opera com apenas metade da capacidade desde julho de 2024, após falhas detectadas em 2022.

Em Mauriti (CE), as obras estão paradas desde janeiro de 2023. Em Penaforte (CE), empresários bloquearam o canteiro de obras em abril do mesmo ano, cobrando dívidas de até R$ 4 milhões do consórcio responsável. Os atrasos não são incidentes isolados: são sintomas de um governo que deliberadamente negligencia soluções de longo prazo porque elas não rendem votos imediatos.

O desrespeito ao povo nordestino não para na água. O programa Cozinha Solidária, também sob o guarda-chuva do Ministério do Desenvolvimento Social, destinou R$ 5,6 milhões à ONG Mover Helipa, liderada por um ex-assessor do PT. Essa ONG subcontratou outras entidades, todas com laços petistas, para distribuir marmitas em comunidades carentes. Muitas dessas refeições sequer chegaram ao destino.

A ONG Unidos Pela Fé, comandada por um ex-assessor de vereador do PT, declarou ter entregue mais de 4.500 quentinhas em dezembro de 2024. Nenhuma foi entregue. O Instituto Rosa dos Ventos, ligado a um assessor do deputado federal Nilto Tatto (PT), entregou apenas 400 refeições em janeiro de 2025, de um total contratado de 4.583. As prestações de contas dessas ONGs foram quase idênticas e todas elaboradas por um único advogado — também ligado ao grupo.

Esses dados mostram como programas de combate à fome e à seca estão sendo convertidos em ferramentas para irrigar aliados políticos com verba pública. Enquanto isso, a população mais vulnerável permanece dependente, sem acesso regular à água, à alimentação e à dignidade.

O uso sistemático de ONGs como cabos eleitorais disfarçados de assistência social cria uma estrutura perversa: os mais pobres seguem dependentes do governo — não por falta de alternativas, mas porque elas são deliberadamente sabotadas. A transposição não anda. As cisternas não funcionam. As marmitas viram fantasmas em planilhas falsas.

Lula se apresenta como defensor dos pobres, mas seu governo opera como uma máquina de clientelismo, onde a dor do sertanejo se transforma em palanque. No fim, a sede e a fome continuam. Mas o apoio político segue alimentado. No Brasil de hoje, o Nordeste ainda é tratado como massa de manobra e o governo como dono do curral.

Foto de Carlos Arouck

Carlos Arouck

Policial federal. É formado em Direito e Administração de Empresas.