Paulo Figueiredo, o direito ao pensamento único e a burrice endêmica do jornalismo da grande mídia

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A entrevista de Paulo Figueiredo Filho ao Metrópoles foi das mais interessantes. Para além da discrepância intelectual – até mesmo cognitiva – entre entrevistado e entrevistador, as caras e bocas das jornalistas foram reveladoras. Demonstraram que no Brasil do Super-Herói com vestes togadas você tem como único direito justificar o poder sem limites – nunca cometer o sacrilégio de questionar. Além, é claro, da incultura flagrante das donas da bancada, algo comum nas redações jornalísticas da grande mídia.

Não vou comentar parte por parte, a intenção deste humilde artigo está longe disso. Porém, sinto-me obrigado a citar o momento em que o sr. Figueiredo contradiz a jornalista ao empregar o esforço hercúleo de fazê-la repetir o que ela própria tinha acabado de ler. Ao falar que o deputado Eduardo Bolsonaro (PL-SP) tinha sacrificado a anistia dos partícipes do 08 de janeiro pela do seu pai, o ex-presidente Jair Bolsonaro, ela não se deu conta que as mensagens utilizadas para embasar o seu argumento mostravam o contrário. É constrangedor, mas não surpreendente. No país dos que pouco sabem e têm orgulho e obstinação em desaprender ainda mais, faz total sentido que uma jornalista não consiga interpretar uma simples mensagem de WhatsApp.

Quando ele fala em senso de justiça e no retrocesso civilizatório ocasionado pela sua perda, a história está do seu lado. Os direitos fundamentais que qualquer ser humano tem ao nascer também englobam o direito a um julgamento justo e com juiz imparcial, além da ampla defesa.

Corroídos pela mentalidade revolucionária com doses de estupidez pseudointelectual, os porta-vozes das classes falantes brasileiras não sabem que isso é resultado direto da Inquisição: a Igreja Católica instituiu tribunais para investigar as heresias da Idade Média e impedir a justiça com as próprias mãos por parte do povo – bem como a pena de morte do Estado pelo crime de lesa-majestade. O inquisidor tinha o dever de ser justo e benevolente com os investigados, além de tentar evitar ao máximo que eles fossem julgados pelo poder temporal. Ao contrário da imbecilidade comum imperante nos meios acadêmicos e no imaginário popular, a Santa Inquisição inaugurou procedimentos utilizados pelo Direito que garantem a qualquer cidadão os meios necessários para provar sua inocência. Não por acaso os revolucionários de toda sorte nutrem profundo desprezo pelas regras legais, pois elas atrapalham a aniquilação do inimigo – no aspecto penal, eles afrouxam apenas para o banditismo considerado uma força revolucionária tal como preconizado por Herbert Marcuse e a Escola de Frankfurt.

Aqui no Brasil, o Poder Judiciário não tem limites. Nossa Constituição é solenemente ignorada por quem deveria ser o seu guardião, e o vigia do vigia não cumpre o seu papel por medo e omissão. Em que mundo vocês acham que Hugo Motta (Republicanos-PB) terá coragem de pautar a anistia e o fim do foro privilegiado? Ele arrota valentia para os parlamentares da oposição, mas quando a iniciativa desagrada os supremos togados, aí não. A pusilanimidade é a regra.

Isso gera o atual estado de coisas no qual a permissão é exclusiva para baixar a cabeça e concordar com os arbítrios de quem não conhece – ou simplesmente despreza – os limites do poder. Qual é o brasileiro que se sente plenamente confortável para vocalizar sua discordância com a escalada autoritária do Supremo Tribunal Federal que começou em 2019 com o inquérito das fake news? Dizer isso é considerado pelos togados e seus colegas da imprensa como um ‘’ataque às instituições’’ ou ‘’narrativa antidemocrática’’. Basta uma palavra mal colocada e a sua vida é devassada: não foi o próprio Paulo Figueiredo a ser incluído no tal inquérito do golpe por realizar o seu trabalho jornalístico de informar a população sobre uma carta circulante nas Forças Armadas? O sr. Paulo Gonet arrastou a Procuradoria-Geral da República ao escárnio jurídico completo.

Aliás, qual democracia merecedora de tal alcunha impede seus cidadãos de questionar ou levantar dúvidas acerca das autoridades, do sistema eleitoral ou do poder como tal? Se as sacrossantas urnas eletrônicas funcionam plenamente – eu mesmo não me convenci das interrogações lançadas ao seu modus operandi – e não necessitam de qualquer aprimoramento, por que arruinar a vida dos céticos? Eles são mesmos tão habilidosos na oratória a ponto de convencer uma parcela da população com mentiras flagrantes? São simples perguntas.

Perguntar não ofende, exceto se a dúvida abarcar os donos do poder no Brasil. Paulo Figueiredo recordou de forma muito assertiva a importância da liberdade de expressão quando apontou a relação entre as palavras e a violência – não da forma ardilosa apresentada pela grande mídia. Quando não há saliva, há pólvora: se você não pode expressar livremente suas ideias e é impedido de defender aquilo que acredita, resta o uso da força – que é o exato oposto da política, o meio civilizado para resolvermos os nossos problemas.

Censurar, perseguir e até mesmo extirpar uma determinada corrente ideológica do debate público nunca acaba bem. O que aconteceu na Espanha? Socialistas espanhóis tentaram varrer da pólis e da memória popular a legítima alma espanhola – católica, monarquista e antirrepublicana. Incendiaram igrejas, mataram padres, violentaram freiras e aniquilaram opositores políticos – caso emblemático foi o de Calvo Sotelo. A reação aconteceu e os anos da ditadura franquista foram consequência direta de tal ação. Todo e qualquer autoritarismo merece ser condenado, por isso mesmo devemos recordar sempre as suas causas.

Paulo Figueiredo presta um grande serviço ao Brasil. E antes que digam que ele está desautorizado a falar dos nossos problemas por estar em outra nação, recordem que José Bonifácio, Oliveira Lima, Joaquim Nabuco e Carlos Lacerda também estiveram na mesma situação – todos eles grandes patriotas e homens de fé inabalável nesta terra. Quanto aos assuntos ordinários como taxação e eleição, deixo para os inaptos do dito jornalismo profissional. A burrice é mesmo uma dádiva, mas só por aqui é premiada com gordos salários e passe livre para mentir.

 

Foto de Carlos Júnior

Carlos Júnior

Jornalista