O voto de Cármen Lúcia... Traída pela própria cegueira (veja o vídeo) - Parte I

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Nada como buscar uma personalidade maior do que você mesmo, para confrontação o errante. O problema é quando você esquece do conceito e, despercebidamente, usa apenas a narrativa. Um verdadeiro óbvio ululante típico. Foi o tropeço cometido pela ministra Cármen Lúcia na inicial do seu voto.

Ao tentar impor e apoderar-se do talento literário e da qualidade moral do escritor francês Victor Hugo e do seu livro Histórias de um Crime, Cármen Lúcia esqueceu-se de olhar pelo retrovisor. E o que estava atrás dela era o próprio STF e os motivos políticos que estavam carregando nas costas. Com ares professorais, Cármen entendia que estava abafando.

Pontuando:

De cara, blasfemou, ao associar o título do livro à expressão “o crime é o golpe de estado”, que é coisa da cabeça dela. Não existe isso no nome do livro, e no afã de aparecer, trocou as bolas, e talvez quisesse apenas ilustrar suas próprias palavras, mas que deveria dizer ao contrário, que “golpe de estado é um crime”, o que de fato é!

Depois disse “...que de 1851 a 1870, quase 170 anos atrás…”, sem contextualizar a que se referiu o período, uma vez que este foi o período de exílio do autor, e também o período que o livro foi escrito. Se considerado o ano de 1870, são 155 anos, longe dos 170 anos, mas se considerou 1951 ou a média, aí passa mais próximo… (picuinha de zelo deste autor!)

Numa passagem do livro, citou o diálogo de um personagem da armada com alguma autoridade, descrevendo algumas propostas do primeiro para o segundo personagem. E aí reside o ponto; acho que a ministra se atrapalhou sem perceber, porque parecia estar falando da própria corte a respeito de Golpe de Estado. 

Alguns tópicos que estavam no “decreto” proposto, e a resposta da autoridade dizendo que aquilo era um Golpe de Estado, apontam para o que ocorria exatamente naquele momento do julgamento, e dos acontecimentos antes dele para culminar nele próprio. 

Senão, vejamos na justificativa da autoridade para afirmar que seria um Golpe de Estado:

  • Nós somos a minoria e seríamos a maioria;
  • Nós somos uma porção da Assembleia e agimos como se fossemos a Assembleia inteira;
  • Nós que condenamos a usurpação, seríamos os usurpadores;
  • Nós que somos os defensores da Constituição, afrontaríamos a Constituição;
  • Nós, os homens da lei, violaríamos a lei.

Então, conforme o relato da ministra, evoluiu o seguinte diálogo: 

  • O segundo personagem afirmou: Golpe de Estado! 
  • Sim, respondeu o primeiro personagem, mas um Golpe de Estado para o bem!
  • O mal, feito para o bem, continua sendo o mal.
  • Mesmo quando ele tem sucesso?
  • Principalmente quando ele tem sucesso. 
  • Por quê?
  • Porque ele se torna um exemplo e vai se repetir!
  • Mas a razão do Estado existe!
  • Não! O que existe é a lei. É o estado de direito.

Ora, para entender o meu ponto de vista, ou seja, que a ministra parecia estar se referindo ao próprio STF, basta imaginar que o primeiro personagem é o Alexandre de Moraes e o segundo, o Luiz Fux, para ficarmos no âmbito da atual formação da corte. 

Basta imaginar o Alexandre de Moraes no papel daquele que apresentou a proposta, e seu interlocutor, o Fux (único juiz de carreira da corte), como a autoridade que recebeu a proposta.

Imaginemos, então, o diálogo:

  • Moraes, isso que propôs é Golpe de Estado!
  • Mas, Fux, é um Golpe de Estado para o bem!
  • Moraes, o mal, feito para o bem, continua sendo o mal.
  • Mesmo quando ele tem sucesso, Fux?
  • Principalmente quando ele tem sucesso, Moraes.
  • Por quê, Fux?
  • Moraes… porque ele se torna um exemplo e vai se repetir!
  • Mas a razão do Estado existe!
  • Não, Moraes! O que existe é a lei. É o estado de direito.

Fica fácil entender quem aplicou o golpe de verdade, que no caso, vingou, até aqui, com a condenação já sentenciada. 

Não é claro isso, ministra? Foi mal nessa, hein! Caiu na própria armadilha.

Assista! 

Foto de Alexandre Siqueira

Alexandre Siqueira

Jornalista independente - Colunista Jornal da Cidade Online - Autor dos livros Perdeu, Mané! e Jornalismo: a um passo do abismo..., da série Uma coisa é uma coisa, outra coisa é outra coisa! Visite:
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