A velha mídia proporciona a seu público a mesma "mercadoria" que os partidos de esquerda oferecem à militância
08/10/2025 às 08:16 Ler na área do assinanteTenho assistido a canais do YouTube que exibem e comentam trechos de matérias divulgadas por veículos da mídia oficialista. Firmou-se em mim a convicção de que os membros desse que chamo “Consórcio Goebbels” pretendem proporcionar a seus leitores e espectadores a mesma mercadoria, linguagem e chavões que os partidos de esquerda disponibilizam à militância. São tão rasgadamente governistas, esses veículos, tão jungidos ao STF, que parecem trazer no pescoço coleira e guia. De contrapeso, ainda empurram um pacote de conteúdos que funciona como arsenal bélico esquerdista da guerra cultural. Neste particular, com qualidade técnica de fazer inveja ao jornalismo de Havana, cumprem papel semelhante ao dos cubanos Granma e Cuba Visión.
Enquanto transcorre a crise de relações entre Brasil e Estados Unidos, repórteres e comentaristas convidados se empenham em responsabilizar por toda a encrenca um deputado federal e mais dois ou três jornalistas brasileiros exilados. É como se o desinteresse da máquina do Estado brasileiro, as fanfarronadas de Lula e a hipertrofia do poder do Supremo nada tivessem a ver com a crise. Para o jornalismo oficialista em que a velha imprensa se autodestrói, nada seria mais perfeito que uma nação formada, exclusivamente, por falantes radicais de esquerda, onde toda divergência, além de amaldiçoada e investigada, estivesse censurada ou de tornozeleira, ou presa ou multada. Nossos pesares institucionais são bem conhecidos. Mesmo assim, os donos do poder posam para fotos, entrevistas e homenagens midiáticas como socorristas do “Estado Democrático de Direito”. Arre!
A sociedade custeia um governo inteiro, do presidente ao servente; ninguém vê, mas se reconhece a existência pelo estrago que faz com o dinheiro alheio. A sociedade paga as duas casas do Congresso, dos dois ditadores que as presidem aos porteiros; todos existem, mas, sob pressão, estão reduzidos à impotência sempre que se requer o desempenho na representação da cidadania. A nação paga o STF e amplia seus quadros funcionais; mas, como tantos, ali, querem fazer justiça e política, trocam os pés desta pelas mãos daquela. Ou vice-versa.
Recentemente, transcorreu em ato low profile, sem pompa nem circunstância, a posse do ministro Fachin na presidência do STF. Li a íntegra de seu discurso e ele em nada alterou a preocupação que levo para as horas noturnas, quando neurônios inquietos espantam o sono. Embora tenha mencionado a necessidade de contenção, ele foi abundante ao demarcar o amplo espaço da vida social que vê sob zelo da Justiça. Movido por provável idealismo hegeliano discorreu sobre tudo que precisa de cuidados para configurar o jardim do paraíso bem aqui, na Pindorama nacional, um país a cada dia mais empobrecido pelo Estado. E abriu uma avenida para atividades paralelas às do Congresso Nacional.
Nada li sobre o retorno do STF ao leito da normalidade institucional, fim do ativismo e descarte da insaciável esponja de prerrogativas. Não serve à nação, pelo bom caminho da democracia e do Estado de Direito, um Congresso sequelado por constantes ameaças reais, prováveis ou improváveis emitidas pelo poder togado. Não servem à liberdade os atos de censura, a justiça raivosa, o fim do mundo de tantos inquéritos e um Supremo que anuncia como vai reagir se tal ou qual decisão for tomada pelo Legislativo.
Ante tudo que vivemos, não serve à sociedade um jornalismo de porta-voz, cortesão do poder, que transmite recados e retém, na peneira das inconveniências, os fatos que a nação não deve conhecer. É incrível que tantos profissionais de imprensa não percebam que tal situação fica quilômetros além do ridículo.
Percival Puggina
Membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+.