O nordeste está abandonado, dominado pelas facções criminosas... E o Brasil finge que não vê

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A escalada do crime organizado nas regiões mais belas do país revela o colapso silencioso do pacto federativo

O Brasil sempre olhou para o Nordeste com uma mistura de encantamento e negligência.

Encantamento pelas praias de beleza estonteante, pela cultura pulsante, pela força de um povo que resiste. Negligência, porém, quando se trata de garantir segurança, dignidade e presença efetiva do Estado.

Hoje, essa negligência se transforma em tragédia anunciada.

O que antes eram destinos turísticos celebrados mundialmente — Jericoacoara, Pipa, Ilhéus, Mangue Seco, Porto de Galinhas — agora figuram em relatos de terror.

Facções criminosas como Comando Vermelho, PCC, ADA, Sindicato do Crime e Trem Bala tomam conta de territórios, impõem taxas de “segurança” a moradores e comerciantes, expulsam empresas de internet, proíbem festas e até determinam como as portas das casas devem permanecer — sempre abertas, para facilitar fugas em caso de confronto.

A presença do crime organizado não é mais subterrânea.

É explícita, armada, monitorada por câmeras clandestinas, e sustentada por um silêncio institucional que beira a cumplicidade. Em Mangue Seco, bandidos circulam em bugues com fuzis. Em Ilhéus, turistas foram assassinados por suspeita de ligação com facções rivais. Em Porto de Galinhas, até a Starlink foi banida por não pagar a “taxa de serviço” imposta pelo tráfico.

O que está acontecendo no Nordeste não é apenas uma crise de segurança pública.

É uma ruptura do pacto federativo. É a criação de zonas autônomas onde o Estado não entra, não protege, não responde. E enquanto isso, autoridades seguem em discursos vazios, em promessas recicladas, em uma desfaçatez que insulta a inteligência e a dor de quem vive essa realidade.

O Nordeste está se distanciando do Brasil — não por vontade própria, mas por abandono.

A cada dia, a região se torna menos acessível, menos segura, menos livre.

E o país, como um todo, precisa decidir: vai continuar fingindo que não vê, ou vai finalmente assumir a responsabilidade de proteger o que ainda resta?

Porque se o Brasil perder o Nordeste, não será apenas uma perda territorial. Será uma perda moral. E talvez, irreversível.

Foto de Jayme Rizolli

Jayme Rizolli

Jornalista.