A China no contexto da globalização

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A China já era um grande império no século II a.C., com invejável cultura filosófica, científica e econômica. Aos poucos foi decaindo até a chegar ser totalmente explorada pelo Reino Unido, no século XIX. A degradação cultural da exploração foi muito grande, culminando com duas Guerras do Ópio (1839/1842 e 1856/1860). Na primeira metade do século XX o país foi invadido pelo Japão, enquanto era administrado por um governo corrupto subordinado ao governo britânico.

Em 1921, seguindo o exemplo da Revolução Russa, foi criado o Partido Comunista Chinês (PCCh), sob a liderança de Mao Tsé-tung. Aconteceu, então, a Grande Marcha - um exército de guerrilheiros que percorreu todo o território nacional por 28 anos, até que, em 1949, derrotou o generalíssimo Chiang Kai-shek, líder do Partido Nacionalista, mesmo sem o apoio ostensivo da União Soviética. A China era um dos países mais pobre do mundo – a expectativa de vida média era de 35 anos. O novo governo, querendo romper o ciclo de pobreza, resolveu adotar a política de coletivização de terras e estatização total de empresas, a exemplo do que ocorria na União Soviética.

Em 1950 a China entrou na Guerra da Coreia contra os EUA e aliados, forçando uma declaração de apoio de Stalin. Mao mandou bombardear diversas ilhas no estreito de Taiwan, sem consultar o governo soviético, desencadeando uma crise internacional de grandes proporções.

Em 1955 Mao lança o programa “Maré Alta Socialista” para acelerar a coletivização do campo e para aumentar a produção de cereais, algodão, carvão e aço. Foi um fracasso provocando fome entre os camponeses e falta de estoques industriais. O primeiro ministro Chu En-Lai e outros planejadores da economia pressionaram para que houvesse uma desaceleração do ritmo de coletivização, na primavera de 1956. Mao recua, mas lança a campanha das “Cem Flores” para garantir o apoio de cientistas e intelectuais ao desenvolvimento econômico e social.

Kruschev, em 1956, denunciou Stalin e o culto da personalidade, criticando duramente a desastrosa campanha de coletivização soviética, o que fortalece os opositores da “Maré Socialista”. Em 1957 Mao ataca e desprestigia o primeiro-ministro Chu En-Lai (o intelectual que fazia as utopias acontecerem) e os planejadores que discordaram de sua política econômica. Vários líderes provinciais foram expulsos do PCCh e punidos severamente.

Kruschev, em novembro de 1957, entusiasmado com sucesso do lançamento do Sputnik anunciou para o mundo que a União Soviética superaria, em 15 anos, a produção econômica dos EUA. Mao, não querendo perder a liderança do mundo comunista, lançou o programa “Grande Salto Adiante” objetivando a conservação da água e propondo aumentar a produção agrícola e industrial. A proposta era ultrapassar, em 15 anos, a economia da Grã-Bretanha. O premier Chu, mesmo sendo frontalmente contra o programa, foi obrigado a fazer declarações de apoio.

Os que se opunham ao programa eram executados sumariamente. A fome e a devastação dos campos e das fábricas foram enormes, deixando um saldo de cerca de 45 milhões de mortos pela inanição, tortura e execuções. Em 1962 o programa foi desativado e grandes quantidades de alimentos foram importadas do Ocidente.

Mao, em 1966, lançou a “Grande Revolução Cultural Proletária”, instigando a população a se rebelar contra as autoridades, acusadas de burocratização. As Guardas Vermelhas fazem perseguições em larga escala, extrapolando os objetivos iniciais. Chu En-Lai tenta fugir da China e morre em desastre aéreo. Registrou-se um novo desastre social, que se prolongou por cerca de 10 anos.

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Após a morte de Mao, em 1976, Deng Xiaoping, um dos homens de confiança do velho guerreiro, assumiu o poder. Foi lançado um novo plano, as “Quatro Grandes Modernizações: indústria, agricultura, ciência e tecnologia e Forças Armadas”, criando-se, também, as Zonas Econômicas Especiais para empresas estrangeiras. Era o início de novos tempos para os 1,3 bilhão de chineses que ainda seriam usados, por muitos anos, como mão de obra barata para sustentar uma “concorrência espúria” que infestaria o mundo com produtos de baixa qualidade, comercializados a preços imbatíveis.

Com o fim da “guerra fria” Deng Xiaoping foi substituído pelo presidente Xi Jinping que, através de novos investimentos, procurou nivelar as disparidades regionais e promover o desenvolvimento nas regiões mais fracas do país.

O economista Jim O’Neill, em 2001, referindo a quatro países emergentes (Brasil, Rússia, Índia e China) usou o termo BRIC. Em 211 ele acrescentou um S para incluir a África do Sul no grupo (South Africa).

Em 2013 foi lançado o projeto “Iniciativa Cinturão e Rosa”, onde Jinping procurou infundir vida nova à antiga Rota da Seda que durante séculos conectou a China e a Europa. Com essa iniciativa procura-se construir uma ponte entre povos de diferentes países e culturas.

No “1º Encontro do Grupo Líder Central para Assuntos Financeiros e Econômicos”, em 2015, Xi Jinping formulou o programa “reforma estrutural da demanda” com o objetivo de corrigir o fluxo da queda da procura mundial por produtos chineses. A reforma foi assentada em cinco diretrizes básicas: estabilização da macropolítica, aperfeiçoamento da política industrial, revitalização da micropolítica, implementação da reforma política e apoio à política social.

A implementação desses planos deram tão certo que a China se tornou a segunda economia mundial, atrás apenas dos EUA. E, como se isso não fosse suficiente, está comprando o Brasil. Segundo o Itamaraty (Ministério das Relações Exteriores), os chineses compraram 21 empresas brasileiras, pelo valor aproximado de US$ 21 bilhões, e que o investimento chinês anunciado para o Brasil, em 2018 é de USS$ 20 bilhões.

Em setembro deste ano reuniu-se a cúpula do Brics, no Centro de Conferências Internacionais e Exposições de Xiamen, com a temática “Brics: Parceria mais Forte para um Futuro mais Brilhante”. Na ocasião Xi Jinping anunciou que a China lançará o “Plano de Cooperação Econômica e Técnica para os Países do Brics”, com um aporte inicial de 500 milhões de yuans. O objetivo do plano é facilitar o intercâmbio de políticas e a cooperação prática nos campos econômico e comercial. Além disso, a China contribuirá com US$ 4 milhões para o Instrumento de Preparação de Projetos do Novo Banco de Desenvolvimento (NBD).

Em 2017 o governo chinês rebatizou seu programa econômico para “reforma estrutural da oferta”, introduzindo novas medidas para resolver os novos problemas surgidos com a globalização de seus compromissos de comércio exterior. As cinco linhas mestres do novo plano são: corte de sobrecapacidade – pretende-se anular, gradativamente, 50 milhões de toneladas da capacidade de aço e mais de 150 milhões de t da capacidade de carvão; redução dos estoques de unidades imobiliárias – o governo quer reduzir o estoque do mercado imobiliário nas cidades de médio porte por meio da urbanização de 100 milhões de pessoas; desalavancagem – o governo pretende baixar a taxa de alavancagem (taxa média de endividamento de ativos) e regular os empréstimos governamentais; redução de custos – o governo pretende cortar os impostos das empresas em 350 bilhões de yuans e as taxas em 200 bilhões de yuans; o governo pretende aumentar investimentos em projetos de melhoria ecológica, da agricultura e em áreas associadas à qualidade de vida das pessoas; pretende, também, fomentar o desenvolvimento e, ao mesmo tempo, melhorar seus sistemas e instituições.

Enquanto isso, no Brasil, a política de venda de ativos públicos vai de “vento em popa”, os aumentos de impostos continuam crescendo, a distribuição de benesses para que os parlamentares acobertem atos de corrupção é uma realidade. A impunidade ainda é significativa.

Foto de Landes Pereira

Landes Pereira

Economista e Professor Universitário. Ex-Secretário de Planejamento da Prefeitura de Campo Grande. Ex-Diretor Financeiro e Comercial da SANESUL. Ex-Diretor Geral do DERSUL (Departamento Estadual de Estradas de Rodagem). Ex-Diretor Presidente da MSGÁS. Ex-Diretor Administrativo-Financeiro e de Relações com os Investidores da SANASA.

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