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Delegado Segovia, "por qué no te callas?"

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Fernando Segovia, que pelo nome certamente tem ancestrais espanhóis, quiçá oriundos da encantadora Segóvia a poucos passos de Madri, está se saindo muito mal como diretor-geral da Polícia Federal.

A primeira mancada foi em Novembro de 2017, quando assumiu a direção geral da instituição. Referindo-se ao episódio da corridinha com a mala entupida de dinheiro vivo, que o então deputado Rodrigo Rocha Loures (PMDB-MG), ex-assessor do presidente Michel Temer e seu homem de confiança, empreendeu após receber mala e dinheiro do executivo Ricardo Saud, da JBS, Segovia declarou publicamente e questionou se "uma única mala" seria suficiente para determinar se houve ou não crime.

Depois veio a nomeação de Felício Laterça, então delegado federal em Macaé, para ser o superintendente da Polícia Federal no Estado do Rio de Janeiro. Não durou muito e Segovia se viu obrigado a anular a nomeação por razões que nem precisam ser repetidas aqui.

E agora, Segovia mais uma vez abriu a boca e em entrevista acenou com a possibilidade do arquivamento do inquérito policial que investiga se o presidente Temer cometeu crime de favorecimento, no cabeludo caso do "decreto dos portos".

Saiba o delegado-chefe da Polícia Federal que o ministro Luís Roberto Barroso, do STF - a quem Segovia é seu jurisdicionado e ao ministro, Segovia também deve obediência - que Barroso já mostrou que vai ser muito mais rigoroso com o diretor-geral da PF do Brasil do que foi o Rei Juan Carlos da Espanha quando, na XVII Conferência Ibero-Americana realizada em Santiago do Chile, em 2007, não suportando mais as inoportunas e grosseiras intervenções de Hugo Chaves, que interrompia o discurso do primeiro-ministro espanhol José Luis Zapatero, o Rei levantou-se e, dirigindo-se a Chaves,  furioso, disse em voz alta: "Por qué no te callas?".

Delegado Fernando Segovia, o senhor é apenas o diretor-geral da Polícia Federal. Sua autoridade perante seus subordinados, inclusive colegas seus, também delegados de polícia, é meramente administrativa. E nada mais do que administrativa. O senhor não preside inquérito policial algum. O senhor está, moral e legalmente impedido - caso não estivesse juridicamente impossibilitado como está - de comentar, em público ou não, sobre inquérito que o senhor não preside e que, por descuido e ilegitimamente, esteja de toda a investigação inteirado. E ainda que presidisse, o decoro exigiria e exige o silêncio. Se Delegado de Polícia que preside inquérito policial não pode dar entrevistas nem revelar o que contém os autos do inquérito, muito menos seu chefe hierárquico e diretor-geral da instituição.

E mais: no escabroso caso do "decreto dos portos", somente o ministro Luís Roberto Barroso (autoridade judicial) tem o poder legal para ordenar seu arquivamento. A prerrogativa do delegado de polícia (autoridade judiciária) que preside o inquérito policial e do Ministério Público que tenha solicitado sua instauração, não vai além do direito de pedir o arquivamento, pedido que pode ou não ser acolhido pela autoridade judicial, no caso o ministro Barroso.

Delegado não arquiva inquérito policial, doutor Segovia. Nem o Ministério Público, ainda que titular da ação penal que do inquérito possa gerar, tem a prerrogativa de arquivar inquérito policial.

Doutor Segovia, parece que o senhor não está dando certo na chefia da Polícia Federal brasileira.

Em tão pouco tempo, três mancadas. Que feio!

O exercício do seu cargo exige solenidade, austeridade, discrição, independência,  imparcialidade, serenidade, sabedoria jurídica e tantos outros deveres que o povo brasileiro espera de um diretor-geral da Polícia Federal. 

E a polícia que o senhor passou a ser o chefe máximo é instituição criada para a defesa do Estado Nacional, a defesa do Brasil e de todo o seu patrimônio, material e imaterial.

Doutor Segovia, saiba o senhor que, no passado não tão remoto,  já tive como adversário (não, como inimigo), o então advogado Luis Roberto Barroso, num famoso pleito judicial aqui no Rio de Janeiro cujo resultado ultrapassou as fronteiras do país.

O doutor Barroso joga limpo. Não se acovarda. Conhece a Ciência do Direito, numa visão, sublimação e plenitude que só os predestinados têm. E neste Brasil de hoje, qual o outro predestinado?

Doutor Segovia, seja o mais reverente e verdadeiro, com o ministro Barroso, com a instituição Polícia Federal, com o Brasil e todo o seu povo.

Somos mais de duzentos milhões a vigiar a sua atuação.

E temos uma imprensa livre.

Doutor Segovia, para o bem do povo e para a felicidade geral da Nação, "por qué no te callas"?  

Foto de Jorge Béja

Jorge Béja

Advogado no Rio de Janeiro e especialista em Responsabilidade Civil, Pública e Privada (UFRJ e Universidade de Paris, Sorbonne). Membro Efetivo do Instituto dos Advogados Brasileiros (IAB)

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