Declaração Universal dos Direitos Humanos

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A primeira metade do século XX foi marcada por duas guerras mundiais e muitos conflitos localizados. Violência indiscriminada, massacres e discriminações raciais e religiosas disseminaram-se pelo ciclo planetária Terra. A segunda guerra trouxe consigo crueldades tecnológicas associadas a crueldades primitivas indescritíveis. Culminou com as bombas de Hiroshima e Nagasaki. As nações vencedoras do conflito (se é que houve vencedor), lideradas pelos EUA e pela URSS, na Conferência de Yalta, em 1945, estabeleceram as bases para uma utópica paz mundial enquanto a “guerra fria” esquentava.

Os países aliados, vencedores da Segunda Guerra, adotaram como princípio de liberdade, quatro eixos básicos: liberdade de religião; liberdade de pensamento e de expressão; liberdade por necessidades, e liberdade de viver livre do medo. Assentado nesses princípios, o canadense Peters Humphrev (então Diretor da Divisão de Direitos Humanos do Secretariado das Nações Unidas) coordenou o projeto da Declaração Universal dos Direitos Humanos que seria aprovada em 10 de dezembro de 1948.

No preâmbulo da DUDH os países membros da ONU se comprometiam garantir o efetivo cumprimento dos direitos enunciados na Declaração, em toda sua extensão. Alguns trechos merecem destaque: “Toda pessoa tem direito a um padrão de vida capaz de assegurar a si e a sua família saúde e bem-estar, inclusive alimentação, vestuário, habitação, cuidados médicos e os serviços sociais indispensáveis, e direito à segurança em caso de desemprego, doença, invalidez, viuvez, velhice ou outros casos de perda dos meios de subsistência”; “Toda pessoa tem direito à instrução e à educação. A instrução será gratuita nos graus elementares e fundamentais. A instrução elementar será obrigatória. A instrução técnico-profissional será acessível a todos, e a educação superior está baseada no mérito”.

O ex-senador Pedro Simon, em 2008, nas comemorações dos 60 anos da Declaração Universal dos Direitos Humanos disse: “É bem verdade que vieram, depois, tantas outras guer­ras: Coreia, Vietnam, Kosovo, Bósnia, Afeganistão, Iraque... Vieram repetidos conflitos étnicos. Vieram milhões de refugiados, com seus esqueletos expostos pela inanição. Vieram, anos a fio, todos os tipos de segregação, racial, social, política, de gênero... Vieram as guerras civis não declaradas, com mi­lhões de vítimas da violência, urbana e rural. Veio a fome, que mutila, hoje, um bilhão de seres humanos em todo o planeta. Vieram tantos muros, reais e virtuais, a separar dois mundos, um além dos limites do supérfluo, outro muito aquém do necessário. Vieram os “condomínios”, in­dividuais ou coletivos, com todo o aparato de segurança, a demarcar até onde podem chegar os excluídos, muitas ve­zes pela loteria da própria vida. Vieram, enfim, quem sabe, os limites entre os quem têm, e os que não têm, de fato, direitos humanos, na sua plenitude”.

Os políticos brasileiros nunca se preocuparam com a Declaração Universal dos Direitos Humanos, porque estavam envolvidos no processo de enriquecimento fácil. Ao defenderem seus interesses pessoais e os direitos de seus grupos, dilapidaram os cofres públicos e extirparam a moral, a ética e a honestidade da administração dos bens públicos. Paralelamente, construíram salvaguardas que lhes garantiram a impunidade e a perpetuidade de corruptos nos vários níveis e estâncias do poder e da sociedade. O esdruxulo sistema partidário vigente garante a expansão de facções instrumentalizadas para a lavagem de dinheiro e para a justificativa jurídica que blinda a roubalheira.

Os direitos humanos, aos poucos, foram sendo destruídos enquanto os grupos de marginais se locupletavam em uma despudorada farra com o dinheiro expropriado dos contribuintes. Esse comportamento levou, pelo exemplo da impunidade, à desagregação das relações sociais no que diz respeito à defesa da cidadania. Por outro lado, lutar pelos direitos humanos não é apenas defender as reivindicações dos movimentos LGBT, combater a truculência policial localizada, bradar contra o racismo, defender as cotas raciais para entrada nas universidades e nos empregos públicos e, paradoxalmente, defender o aborto.

É muito mais que isso, como diz a DUDH: “Toda pessoa tem direito à vida, à liberdade e à segurança”, na plenitude desses conceitos de sociologia política e de fraternidade humana. Direito esse que não deveria ser um privilégio da classe social dominante, mas uma realidade social.

No caso brasileiro, o establishment dominante desmoralizou o sistema político nacional e proporcionou a aproximação das facções partidárias com as facções criminosas (narcotraficantes e outras) e com os movimentos religiosos que se tornaram facções políticas. Os Poderes da República, gradativamente, perderam o controle da situação, enquanto a criminalidade tomava conta do país. O descontrole da corrupção e a expansão do “crime organizado” proporcionaram condições favoráveis para a intervenção militar na segurança pública, reacendendo a esperança daqueles que sonham com a reeleição, incluindo o presidente da República.

As Forças Armadas ocuparam o Rio de Janeiro (que não é o maior território em termos de criminalidade) e o Governo Federal criou o Ministério da Defesa, enquanto a violência e a insegurança aumentaram sensivelmente. Isto porque a ocupação militar não é a estratégia correta para equacionar um problema que tem como causa o consumo de drogas e a corrupção política. Prender, espancar e matar as “mulas” que trabalham para os narcotraficantes é um procedimento errôneo porque o aparato policial-militar não mais assusta os “cabeças do crime organizado”.

Uma “Intervenção Social” capitaneada por um eficiente sistema educacional, tendo como suporte uma bem estruturada política antidrogas, seria mais eficiente que uma ocupação militar mal planejada. A assistência médico-psicológica aos drogados e às suas famílias, incluindo aos que se encontram nos condomínios de luxo e nas instituições públicas e privadas. São fundamentais, também, políticas sociais e de infraestrutura urbana de apoio às comunidades faveladas,

Entretanto, o que se vê no Brasil é o abandono (e o sucateamento) dos sistemas educacional e de saúde pública. O Governo, em 2018, concederá R$ 283 bilhões em inexplicáveis renúncias fiscais (sem nenhum retorno para a sociedade), enquanto o orçamento para a Educação é de apenas R$ 107,5 bilhões e o da Saúde é de R$ 131,4 bilhões.

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Landes Pereira

Economista e Professor Universitário. Ex-Secretário de Planejamento da Prefeitura de Campo Grande. Ex-Diretor Financeiro e Comercial da SANESUL. Ex-Diretor Geral do DERSUL (Departamento Estadual de Estradas de Rodagem). Ex-Diretor Presidente da MSGÁS. Ex-Diretor Administrativo-Financeiro e de Relações com os Investidores da SANASA.

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